Downsizing: Do Processo às Consequências na Perspetiva dos Sobreviventes

Em Portugal, ao abrigo do artigo 359º do Código do Trabalho, o despedimento coletivo (downsizing) constitui uma forma de cessação de contratos de trabalho, promovida pelo empregador e operada simultânea ou sucessivamente no período de três meses, abrangendo, pelo menos, dois trabalhadores (no caso de microempresas ou pequenas empresas) ou cinco trabalhadores (no caso de médias ou grandes empresas).

Os dados fornecidos pela Direção-Geral do Emprego e das Relações do Trabalho (DGERT, 2021) dão conta de 661 empresas que concluíram processos de despedimento coletivo em 2020, fruto da instabilidade económica causada pela pandemia COVID-19.

Mais concretamente, foram cessados contratos de trabalho a 7513 trabalhadores, dos quais 3469 homens e 4044 mulheres. Em 2021, apenas no primeiro trimestre do ano, foram alvo de despedimento coletivo 1006 trabalhadores, e a tendência é que os números continuem em crescendo até ao final do ano.

O downsizing de trabalhadores constitui um processo de elevada complexidade, que vai muito além da redução quantitativa de trabalhadores e custos. É uma estratégia comummente utilizada pelas organizações durante períodos de recessão económica e de elevada vulnerabilidade no mercado (Cascio, 2010), cujo objetivo compreende melhorar a eficiência e o desempenho organizacionais (Rego et al., 2015, p. 726; Chadwick et al., 2004).

Contudo, os resultados de diversos estudos (e.g. Gandolfi & Neck, 2008; Guthrie e Datta, 2008; Love & Nohria, 2005) têm vindo a revelar que a maioria das organizações não alcançaram as metas desejadas após a implementação do downszing, tendo, algumas, inclusive registado diminuição de lucros, perda de conhecimento e memória organizacional e deterioração da qualidade, produtividade e eficácia.

No entanto, processos de downsizing mal conduzidos podem ter, ainda, outras consequências severas para as organizações, tais como a perda de inovação organizacional, menor tolerância a riscos e falhas, moral diminuída, menor satisfação e motivação, maior conflitualidade, perda de confiança, menor capacidade de trabalho em equipa, maior conservadorismo e, consequentemente, maior resistência à mudança (Fisher & White, 2000; Guthrie & Datta, 2008).

Paralelamente, o downsizing aporta, também, custos a nível humano.

A literatura existente permite identificar três categorias de pessoas que são diretamente afetadas por processos de downsizing: vítimas, sobreviventes e executantes. O ambiente de trabalho pós-downsizing é particularmente difícil para os sobreviventes (i.e., os trabalhadores que permanecem na organização após o processo de downsizing), uma vez que estes experienciam elevados níveis de insegurança e stress relativamente às suas perspetivas futuras de trabalho. O estado psicológico destes trabalhadores é frequentemente ignorado antes, durante e depois do processo (Harney et al.,2018), levando a que as organizações não antecipem estados de espíritos negativos e que não se preparem para lidar com a menor produtividade evidenciada pelos seus trabalhadores.

Espera-se que os sobreviventes se sintam gratos às suas organizações por terem conseguido manter os seus empregos e que, por esse motivo, aumentem os seus níveis de produtividade para garantirem que não serão integrados no grupo de trabalhadores dispensados quando for anunciada uma nova ronda de despedimentos.

Contudo, sucede que os trabalhadores que permanecem na organização experienciam sentimentos idênticos (i.e., raiva e insegurança) àqueles que são experienciados pelos colegas que perdem os seus empregos, o que conduz à diminuição dos níveis de lealdade em relação à organização, traduzindo-se, assim, na redução do nível de produtividade e na intenção voluntária de abandonar a organização. Estima-se, inclusive, que a credibilidade da organização diminua 35% após o downsizing (Tsai & Yen, 2018), mesmo quando a gestão de topo garante aos colaboradores que os seus empregos estão absolutamente seguros.

Todavia, as reações dos sobreviventes ao downsizing variam significativamente devido às estratégias de coping que utilizam e ao nível de controlo que acreditam exercer sobre os seus empregos (Neves, 2014). Enquanto alguns trabalhadores podem reagir de forma mais ativa ao processo de downsizing, com mais propensão para expressarem indignação moral e raiva, por exemplo, outros podem adotar uma postura mais passiva, limitando-se a seguir ordens e apresentando sintomas de preocupação e impotência.

Compete, pois, às organizações agirem antecipadamente para prevenirem os riscos de processos mal conduzidos e preconizar medidas destinadas a melhorá-los. Requer-se uma boa preparação/formação dos gestores e dos líderes, e uma comunicação constante e transparente para que todos os envolvidos estejam aptos a lidar com um processo tão doloroso e stressante quanto o downsizing (Rego et al., 2015, p.758).

Desta forma, e atendendo à escassez de estudos realizados sobre a temática do downsizing, quer em Portugal, quer no Brasil, a Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH-Brasil) e a Associação Portuguesa de Gestão de Pessoas (APG) associaram-se a investigadores da UNIJORGE e da Universidade de Lisboa, no âmbito de um estudo sobre a experiência dos trabalhadores sobreviventes que passaram por um processo de downsizing nos últimos 6 meses na sua organização.

Com esta investigação, pretende-se compreender qual é a perceção destes trabalhadores sobre o processo de downsizing, analisar as consequências do mesmo ao nível individual e da relação com a organização e desempenho, bem como observar a relação entre o processo e as consequências, e estudar as possíveis alterações aos contratos psicológicos estabelecidos entre os sobreviventes e a organização.

Para participar no estudo, basta aceder:

Versão PT: https://pt.surveymonkey.com/r/GLSKSP8

Versão BR: https://pt.surveymonkey.com/r/PJPCLVT

Co-autoria: Lara Pico, Maria João Velez e Sónia P. Gonçalves

Referências:

Cascio, W. F. (2010). Employment downsizing: Causes, costs, and consequences. In More than bricks in the wall: Organizational perspectives for sustainable success (pp. 87-96). Gabler.

Chadwick, C., Hunter, L. W., & Walston, S. L. (2004). Effects of downsizing practices on the performance of hospitals. Strategic Management Journal, 25(5), 405-427.

Código do Trabalho – Lei n.º 7/2009 de fevereiro. Diário da República n.º 30/2009 – I Série.

Direção-Geral do Emprego e das Relações de Trabalho (2021). Despedimentos Coletivos – Dados de 2020. Acedido em 9 de junho de 2021 de https://www.dgert.gov.pt/dados-de-2021-relativos-aos-processos-de-despedimentos-coletivos

Fisher, S. R., & White, M. A. (2000). Downsizing in a learning organization: are there hidden costs? Academy of Management Review, 25(1), 244-251.

Gandolfi, F., & Neck, P. (2008). Consequences, payoffs, and fallout of downsizing (A literature review of corporate downsizing: Part 3). Review of International Comparative Management, 9(1), 55-78.

Guthrie, J. P., & Datta, D. K. (2008). Dumb and dumber: The impact of downsizing on firm performance as moderated by industry conditions. Organization Science, 19(1), 108-123.

Harney, B., Fu, N., & Freeney, Y. (2018). Balancing tensions: Buffering the impact of organisational restructuring and downsizing on employee well‐being.  Human Resource Management Journal, 28(2), 235-254.

Love, E., & Nohria, N. (2005). Reducing slack: The performance consequences of downsizing by large industrial firms, 1977–93. Strategic Management Journal, 26(12), 1087-1108.

Neves, P. (2014). Taking it out on survivors: Submissive employees, downsizing, and abusive supervision. Journal of Occupational and Organizational Psychology, 87, 507-534. Retirado de https://doi.org/10.1111/joop.12061

Rego, A., Cunha, M. P., Gomes, J. F., Cunha, R. C., Cardoso, C. C., & Marques, C. A. (2015). Manual de Gestão de Pessoas e do Capital Humano (3ª edição). Lisboa: Edições Sílabo.

Tsai, C. F., & Yen, Y. F. (2018). Moderating effect of employee perception of responsible downsizing on job satisfaction and innovation commitment. The International Journal of Human Resource Management, DOI: 10.1080/09585192.2018.1424014