TáLento

A brincadeira com as palavras leva-nos a concluir que um acento, mal colocado, faz toda a diferença, seja um acento numa palavra ou um “assento” numa empresa.

No que ao “assento” numa empresa diz respeito, em muitas situações, já não se trata da pessoa certa para o lugar certo, frase bastante conhecida no âmbito do recrutamento, mas sim, avaliar se a única pessoa que se candidatou, em resposta a um anúncio, se adapta à empresa e à vaga disponível.

Atuando num dos mais importantes Grupos Económicos Portugueses, com mais de 9000 trabalhadores, dispersos por 22 países e 4 continentes, com vários setores de atividade, desde a Construção, Concessões e Serviços, Imobiliária, Hotelaria, Distribuição e Automóvel, é possível constatar que o tema da atração de novos colaboradores, ocupa um lugar de destaque nas estratégias de atuação das áreas de Recursos Humanos dos vários setores. Já não basta ser uma empresa atrativa, sólida e inovadora. Temos que adaptar e renovar as políticas de atração para fazer face às necessidades dos colaboradores, das mais variadas gerações. 

É certo que, para qualquer candidato, atuar num grande grupo económico continua a ser atrativo, contudo o tema da escassez de recursos humanos passou a ser transversal e a afetar as grandes, médias e pequenas empresas.   

 As estratégias de recrutamento e atração de recursos humanos começaram a ser questionadas e redesenhadas, de modo a poder colmatar as necessidades que a generalidade das empresas começaram a sentir quanto a esta carência de recursos.

Somos um país repleto de história, de talentos passados e atuais, que fizeram e fazem de nós, a nação que somos hoje. Reconhecidos no desempenho das mais variadas funções, a nível internacional, e nos mais variados setores de atividade, desde a Política, mundo empresarial, arte, desporto, entre outros, estamos representados com sucesso e dispersos por todo o mundo, através dos nossos talentos.

A nossa desvantagem é sermos um país pequeno com uma população ativa muito reduzida, com cada vez menos jovens e com um número de reformados e inscritos no subsídio de desemprego bastante elevado. De acordo com vários estudos realizados, o declínio da população portuguesa será acentuado nas próximas décadas. Irá a mão de obra estrangeira ser uma solução, para a escassez de recursos humanos? Conseguirá o governo criar soluções mais ágeis para a legalização de estrangeiros? Iremos conseguir reter mão de obra estrangeira, com salários pouco competitivos, face aos restantes países da Europa?

Analisando alguns números, podemos inferir que os próximos anos vão ser muito desafiantes, no que diz respeito à capacidade dos Departamentos de Recursos Humanos se reinventarem e de criarem condições e estratégias para combater a escassez de Talento, que está a assolar o nosso país e também o resto do mundo.

A “Grande demissão[i]” que assistimos nos Estados Unidos ou o “Lying Flat[ii]” que ocorre na China, estendeu-se por todo o mundo em diferentes escalas. A pandemia acelerou a mudança de hábitos e rotinas das pessoas e das empresas.

Como consequência, os modelos tradicionais de trabalho, foram, de um dia para o outro, alterados. As necessidades dos trabalhadores alteraram-se e as empresas acompanham estas alterações consoante as necessidades dos seus trabalhadores e candidatos, adaptando-se a este novo mundo de trabalho.     

Mas para onde foram as pessoas? Esta pergunta ecoa nas empresas, que estão a passar por esta realidade e que está a afetar a forma e maneira de gerir pessoas e negócios.

De acordo com o “Talent Shortage Survey 2022”, desenvolvido pelo Manpower Group, Portugal é o segundo país do mundo com maior escassez de Talento. Cada vez se torna mais difícil preencher as vagas devido à falta de trabalhadores qualificados.

Portugal fica acima da média global, relativamente às dificuldades de recrutamento, com 75%, ficando abaixo de Taiwan, país com maiores dificuldades, que apresenta um valor de 85%.

Esta escassez está a ter impacto em vários setores, criando uma competitividade, pela atração de Talento, sem igual. Reinventam-se estratégias de recrutamento, especializam-se equipas e tentam-se criar propostas de valor (EVP – Employe Value Proposition) que vão de encontro às necessidades dos trabalhadores.

Em Portugal, as pessoas que atuavam em determinados setores, com a Pandemia, foram obrigadas a parar. Com essa paragem forçada, muitas delas tiveram de mudar de setor. Passaram a atuar em áreas distintas, percebendo, por vezes, que, com menor esforço horário, poderiam receber mais. e/ou com mais tempo para dedicar a si ou família.

As necessidades e as prioridades das pessoas alteraram e cabe às empresas adaptarem-se a este novo modelo de vida. A mudança cultural numa empresa, de acordo com as boas práticas, costuma em média levar 5 a 7 anos, contudo, face a esta nova realidade, é previsível que essa mudança cultural ocorra de forma mais célere.

Este é o terceiro ano desde o início da pandemia e existe um caminho longo a percorrer. Os Recursos Humanos nunca estiveram numa posição tão estratégica como atualmente.

A atração, a retenção, a mudança cultural das empresas, a criação de ambientes de trabalho modernos e a preocupação com o bem-estar dos trabalhadores são atualmente um dos pilares do negócio.

Nessa medida, apesar da função de recursos humanos ter passado por várias dinâmicas nos últimos anos, permanece inalterado o fato de que o capital humano, ainda é, sem dúvida, o ativo mais importante da empresa.


[i][i] Tradução da frase “Big Quit” é uma tendência económica em que voluntariamente, os trabalhadores, demitem-se em massa dos seus empregos.  

[ii] Tradução da frase chinesa “Tang Ping”, um movimento social e estilo de vida chinês cujos seguidores adotam uma vida mais tranquila e não materialista em rejeição às demandas profissionais e expectativas sociais.