A distribuição como reflexo da estratégia da marca – os desafios e as oportunidades

Nos últimos 20 anos, o Marketing e a função do Marketeer passaram por mudanças muito significativas. Isto já não é novidade. O que é novidade, é saber gerir o Marketing nos dias de hoje: num contexto de rápida e constante evolução, em plena mudança digital e comportamental. Numa Era de profunda e rápida transformação, em que a própria palavra “transformação” perdeu impacto, a Distribuição surge cada vez mais como fator-chave para o sucesso da estratégia de Marketing e diferenciação da marca.

São diversos e inúmeros, os Desafios que enfrentam as marcas atualmente. Ao longo deste artigo destaco alguns com os quais me tenho deparado ao longo da minha carreira de 17 anos a trabalhar na área do Marketing e Retail, em marcas nacionais e internacionais.

Personalizar, para Escalar.
O tema da Personalização não é novo e está mais do que presente no nosso dia-a-dia: nos nossos Feeds das redes sociais, nos browsers que usamos e que têm a capacidade de personalizar os resultados com base nas nossas preferências e comportamentos e que, sem nos apercebermos, nos mostram apenas o que os algoritmos concluem que queremos ver.
O consumidor já espera um elevado nível de personalização em tudo – o desafio aqui é conseguir personalizar sem correr o risco de “nichar” (quando não é essa deliberadamente a estratégia), para ser possível escalar e desenvolver o negócio.
Para isto ser possível, há que ter formas de seguir o histórico de compras e as preferências de produtos do cliente para poder fazer propostas relevantes e acertadas (em e-commerce e loja física), ferramentas de comunicação em tempo real como chatbots e assistentes virtuais no caso do online (e aqui os últimos desenvolvimentos de IA são preciosos), ou equipas em loja altamente treinadas para uma vertente comercial de análise de históricos de compras, mas também com a capacidade de compreender o consumidor que têm à sua frente. Finalmente, um programa de fidelidade com o intuito de, não apenas aumentar o nº de atos de compra ou cabaz (com esperança de aumentar o nível de fidelidade), mas sim com o objetivo de conhecer mais profundamente o consumidor e ter jornadas desenhadas com o objetivo de fazer propostas altamente relevantes e que acrescentem valor é essencial.
Avalie as suas ferramentas de personalização, identificando forças e áreas de melhoria. Atreva-se a explorar novas tecnologias como a IA e sistemas que possam ajudar a rastrear o histórico de compras e as preferências dos clientes de forma mais eficaz e que sejam fáceis de analisar e de levar à implementação de novas ações.

Quando em Loja, o mínimo é ser excecional e memorável!
É o que se pretende e o que tem colocado uma pressão sem igual no Offline: a jornada do consumidor em loja tem de ser memorável, sensorial e implicar uma conexão com a marca.
Aqui o desafio é duplo: por um lado, precisamos cada vez mais de uma estratégia drive to store (pois a tentação de fazer as compras no sofá é sempre muito grande) e, por outro lado, precisamos de garantir que quando o consumidor já está em loja, nós conseguimos fazer o nosso papel – deslumbrá-lo (sim, menos que isso nos dias de hoje já parece medíocre)! Este segundo ponto geralmente é mais fácil de desenvolver em ambientes de loja própria, onde é possível trabalhar a relação da equipa de vendas com o consumidor (fazendo-o sempre sentir-se especial), fazer propostas de produtos altamente relevantes (relacionado com a tal personalização) e desenvolver dinâmicas que apenas acontecem na loja física e que não são possíveis de replicar em todo o seu esplendor na loja online – diagnósticos personalizados, dar dicas/ensinar formas específicas de usar um produto, workshops, lançar edições limitadas…
Foque-se em estratégias específicas para envolver os clientes da sua loja física – workshops interativos e que acrescentem valor ao cliente ou eventos exclusivos de lançamento de produtos, por exemplo. Invista na formação da equipa de loja – eles são o rosto da sua marca, da sua visão e encerram em si o poder excecional para criar fãs do seu negócio (no fundo, clientes que se sentem valorizados e especiais)!

Consistência e Omnicanalidade – na prática, como deve funcionar?
A informação, a abordagem, as imagens, etc, – tudo deve ser alinhado e garantir uma coerência ao nível da forma e do conteúdo (ainda que adaptado ao meio em questão).
A integração da boa experiência online e offline é essencial e já não é desejável, é expectável. Isto pode exigir mais do que aparenta, pois a consistência entre o que se faz ao nível de e-commerce, loja física, email marketing, redes sociais e intermediários da venda (farmacêuticos, promotores, etc), pode estar comprometida a partir do momento em que as equipas das empresas trabalham em silos ou sem um fio condutor desde o Briefing à aprovação final. Geralmente vemos diferentes equipas envolvidas nestas áreas e garantir que se trabalha de forma muito próxima e alinhada em cada passo é difícil, mas crucial, já que falamos de equipas que geralmente estão ‘divididas’ entre o marketing, o digital, a agência, o trade, o comercial… Este é um ponto de absoluta importância para as empresas atualmente e que impacta estruturas e formas de trabalhar – passar de uma lógica de Marketing at the core para uma lógica de equipas multidisciplinares por projeto que trabalham juntas e vão revendo os seus contributos em conjunto, para garantir o máximo alinhamento e consistência.
Implemente sessões de alinhamento regulares entre equipas (onde os membros do marketing, digital, comercial, entre outros, podem partilhar informações do que estão a fazer e que um gestor de projeto pode coordenar, para garantir consistência omnicanal).
Além disso, pode ser bastante útil desenvolver um manual de marca detalhado que estabeleça diretrizes claras para a comunicação e design em todos os canais – e não esquecer que tão importante como referir o que queremos, é definir o que não queremos (ser, dizer, mostrar).

Atenção do consumidor: valiosa e mais rara que nunca
À premissa do marketing de que devemos “estar onde o consumidor está”, tornou-se mais difícil do que nunca responder. Porquê? Porque o consumidor hoje está literalmente em todo o lado, ao mesmo tempo. A entrada de um consumidor em loja, por exemplo, deixou de ser simplesmente a entrada de uma pessoa em loja. Trata-se sim da entrada de um individuo que tem acoplado a si dezenas de outras pessoas (através dos grupos de WhatsApp a que vai respondendo, das mensagens de voz que vai ouvindo, dos perfis que vai vendo nas redes sociais enquanto faz scroll e se passeia pela ‘nossa’ loja). Ao mesmo tempo que vai dividindo a sua atenção com tantas pessoas e estímulos virtuais, a sua cabeça consegue subdividir-se ainda mais e, de repente, enquanto responde a grupos de chat, pensa naquele email ‘chato’ que recebeu, na reunião que vai ter, no presente que tem de comprar, na lista do supermercado, na consulta que ainda não marcou e já devia ter marcado… Atualmente, dificilmente estamos no “aqui e no agora”, ou não fosse o Mindulfness um movimento em crescimento. Neste sentido, captar esta atenção fragmentada do consumidor é um desafio enorme para qualquer marca. Se estivermos a falar de e-commerce, estratégias interativas, gamification ou lógicas de recompensa podem ajudar a focar o consumidor (e evitar que salte de página em página fora do nosso website e que vá mantendo o nosso carrinho de compras em ‘standby’). Em loja física, a relação da equipa de loja com o consumidor terá um papel essencial para captar a sua atenção para si, através de velhos hábitos que sempre distinguiram o ser humano dos outros animais e que, de repente, são mais importantes do que nunca numa relação interpessoal: comunicar olhos nos olhos, sorrir com empatia e fazer com que o outro se sinta especial (muito mais especial do que qualquer emoji que pudesse receber naquele momento!).
Garanta que as estratégias que tem delineado têm como um dos pressupostos os múltiplos estímulos a que está sujeito o consumidor – isso facilita a criação de planos cujo objetivo é captar e manter a atenção do consumidor, que só assim vai dar origem ao tão falado engagement.

Diferenciar, para reforçar a vantagem competitiva
Ter uma vantagem competitiva, inovação constante ou trazer valor acrescentado de forma sistemática, sempre foram desafios para qualquer marca. No entanto, nos dias que correm, quando o acesso à informação é ilimitado e a exigência do consumidor atinge níveis mais elevados do que nunca, a palavra desafio parece redutora para o que é exigido às marcas. No entanto, vale a pena dar um passo atrás para recordar que a diferenciação não é apenas sobre o que a marca oferece concretamente, mas também sobre a forma como a marca comunica e como oferece essa vantagem competitiva. Ser relevante e destacar-se no mercado é possível se não esquecermos, na corrida do dia-a-dia, o ‘básico’: quem é o nosso público-alvo, o que vamos colmatar ou acrescentar com o nosso produto/serviço (consumer insight), como vou chegar até ele (comunicação) e como o vou manter (inovação, personalização, excelência no atendimento ao cliente Online/Offline, ações concretas coerentes e pertinentes como a responsabilidade social e ambiental).
Atualize o seu público-alvo se não o fizer há algum tempo: perfil, necessidades, interesses, meios de comunicação que consome, etc. Desenhe uma jornada de consumidor clara e exequível, com ações concretas etapa a etapa – desde o momento em que este toma consciência da necessidade ao momento de pós-compra e fidelização.

Agilidade estratégica: qual o nível certo?
Como é possível estar atualizado e garantir uma estratégia adaptada às necessidades do mercado, que tão rapidamente mudam e, ao mesmo tempo, ter tempo para consolidar insights, analisando e tirando conclusões acertadas? Num mundo que avança tão rapidamente, quando e como saber esperar ou avançar nem sempre é óbvio. O ponto-chave é: avançar ou recuar, deve ser sempre feito com base em informações concretas que ajudem a corroborar a decisão tomada. É aqui que surge a importância de ter na agenda momentos para 1) analisar o histórico de vendas, margens, preços, product mix…; 2) conhecer o cliente atual (análise de vendas por tipo de produto, evolução de determinadas categorias, realizar testes A/B,…); 3) ouvir as diferentes equipas, geralmente experts nas suas áreas (R&D, Marketing, Digital, Vendas, etc); 4) fazer estudos de mercado específicos que ajudem a clarificar os caminhos que podemos ter à nossa frente; e 5) porque não pedir opinião ao nosso próprio cliente, nas redes sociais, via email marketing ou em loja?
Priorize momentos para rever o detalhe do histórico das vendas e evolução do catálogo, entender o comportamento do cliente atual e envolver as diversas equipas da empresa na compreensão do panorama atual e antevisão do futuro. Finalmente, esteja preparado mas, sobretudo, prepare as suas equipas para avançar ou recuar com base em informações concretas, garantindo uma processo ágil, transparente e eficaz para todos.

Em suma, são muitos os desafios em termos de gestão da estratégia e distribuição das marcas, mas para cada dificuldade, são múltiplas as oportunidades. O essencial é ter sempre um bom diagnóstico – após entender qual a verdadeira problemática, será mais fácil perceber as oportunidades e áreas de melhoria!