A importância da promoção da saúde mental e do bem-estar nas organizações

As pessoas passam uma parte significativa das suas vidas no trabalho, e idealmente os empregos trazem significado e estrutura às suas vidas. Tendo em conta esta centralidade da profissão no quotidiano pessoal, torna-se crucial refletir acerca da importância de se criarem ambientes organizacionais seguros e saudáveis.

A natureza do trabalho está a mudar a uma velocidade vertiginosa. Estamos no meio de um fenómeno de globalização e de avanços tecnológicos que colocam desafios novos, como a instabilidade e a insegurança no mundo do trabalho, ou com a introdução das tecnologias da informação a exposição por longas horas a terminais de exibição visual, o sedentarismo ou a possibilidade de, a qualquer momento, puder surgir uma solicitação de trabalho, sem levar em conta a distinção entre horas de trabalho e de descanso, fundamental para o bem-estar físico e psicológico dos colaboradores.

Um dos grandes desafios deste século XXI é combater aquela que a OMS identificou como a sua maior epidemia – o stress – criando sociedades mais saudáveis, através da construção de organizações saudáveis, com foco no bem-estar. É inegável o papel fundamental que o trabalho desempenha na saúde dos indivíduos. O stress no trabalho representa uma ameaça à saúde dos trabalhadores, que se refletirá inevitavelmente na saúde das próprias empresas.

Em 2019, o relatório do Conselho Nacional de Saúde chamava a atenção para o facto de que um ambiente laboral negativo pode contribuir para o desenvolvimento de problemas de saúde física e mental, abuso de substâncias, absentismo e falta de produtividade. Também a Agência Europeia para a Segurança e a Saúde no trabalho, no relatório que produziu a partir de um inquérito às empresas sobre riscos novos e emergentes (2019) alerta  que os riscos psicossociais (stress, mobbing, assédio ou violência) estão presentes num conjunto significativo de organizações, e são percebidos como mais difíceis de gerir do que outros riscos laborais, principalmente devido a uma relutância em falar abertamente acerca destas dificuldades, falta de informação sobre como lidar com estas temáticas e a falta de especialistas que desempenhem um papel de suporte nestas situações. Os dados sugerem ainda que a consciência acerca da presença de riscos psicossociais ainda é insuficiente, o que se liga provavelmente com práticas ainda incipientes e pouco regulares de avaliação de risco por parte das organizações neste âmbito da saúde mental.

De facto, os sinais de alerta têm vindo a surgir por parte da comunidade científica, sem que as práticas de gestão da segurança e da promoção da saúde em contexto laboral acompanhem duma forma equitativa as preocupações plasmadas em variados documentos, encontrando-se ainda limitadas às obrigações legais, sem uma visão preventiva e promotora.

Nos últimos anos têm vindo a ser implementados programas de promoção da saúde no ambiente de trabalho para combater o aumento dos acidentes de trabalho, o presentismo, as faltas por incapacidade ou doença e a perda de produtividade. Um dos principais argumentos para a sua aplicação são as evidências científicas de que a promoção da saúde no ambiente de trabalho pode gerar um retorno sobre o investimento positivo. Contudo, a perspetiva atual vai mais além… a economia de custos é apenas um dos muitos benefícios que podem ser colhidos dum programa de promoção da saúde ocupacional, cuja realização pode trazer consigo um valor sobre o investimento, aumentando o comprometimento com a organização e um compromisso conjunto com o sucesso organizacional. Em empresas saudáveis, cultura, clima e boas práticas criam um ambiente que pode promover o bem-estar e a segurança dos seus colaboradores, bem como a eficácia organizacional. Uma empresa saudável conduz a resultados positivos, sublinhando assim a forte ligação entre lucro organizacional e o bem-estar dos seus funcionários.

O foco na saúde e no bem-estar dos funcionários deve ser então um elemento central de qualquer estratégia de RH e central na forma como a organização opera. A intervenção deve ser preventiva (identificando e reforçando pontos fortes) e de multinível, englobando o indivíduo, o grupo e a organização.

A nível individual devem ser introduzidas intervenções para melhorar a saúde psicológica dos funcionários. Em particular é necessário enriquecer os empregos, melhorar a motivação dos funcionários, ajudá-los a encontrar o sentido no trabalho e aumentar o seu nível de participação. Estas ações visam construir forças pessoais, e realçar os recursos individuais positivos como a inteligência emocional ou a resiliência. Procedimentos que permitem o desenvolvimento pessoal, a confiança ou o perdão, ajudam a aumentar a maturidade e flexibilidade psicológicas, ajudando os colaboradores a interagir uns com os outros de maneira mais saudável e produtiva.

Relativamente ao grupo, é importante salientar a necessidade de respeito entre os elementos que compõem o grupo, aumentar os níveis de comunicação e escuta atenta, a abertura para pontos de vista e estilos diferentes, e a busca de soluções win-win. A pesquisa tem indicado que o sentimento de pertença a uma equipa é fundamental para sensação de bem-estar para a maioria das pessoas, e nesse sentido a intervenção a este nível deve ter o foco na construção de equipas, treino de grupo, e civilidade relacional, promovendo uma cultura de prontidão relacional para interações positivas com os outros colaboradores, com efeitos na redução de conflitos na empresa. A pertença a um grupo saudável ajuda ainda os indivíduos a construir laços afetivos fortes que podem se constituir como o apoio social necessário para enfrentar os desafios e a complexidade do mundo do trabalho.

O centro da atuação ao nível organizacional deve estar situado no aumento das competências de flexibilização e criatividade. Num mundo cada vez mais globalizado e desafiante, criar uma cultura aberta caracterizada pela inovação, com estilos de liderança que promovam a colaboração, autonomia e auto-organização dos colaboradores, vai permitir a redução do stress associado à competição do mundo laboral.

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A estrada da consciencialização e da intervenção ainda é longa, mas a ciência é clara: para que se construam organizações mais bem sucedidas temos inevitavelmente que criar locais de trabalho saudáveis, onde as pessoas possam crescer, produzir e ser valorizadas enquanto usam os seus talentos pessoais para alcançar um bom desempenho, alta satisfação laboral e bem-estar. Quem aceita este desafio?