Então, como se lideram perfis criativos?

Hoje, a Inteligência Artificial é um tema incontornável e debatido com fervor ou com desconfiança, quiçá temor. A discussão intensifica-se assim como as incertezas: “Como vai impactar o futuro do trabalho?”, “Vai gerar desemprego?” ou “Será uma oportunidade ou uma ameaça?”. E, apesar de todas estas dúvidas existenciais e visões díspares, mas legítimas, há algo comum nestas formulações – as pessoas. Por mais que a tecnologia se desenvolva, por mais automatizadas e eficientes que sejam as funções, as pessoas são e serão sempre essenciais e quem mais beneficia da evolução tecnológica ou de outra índole.

Posto isto, impõe-se compreender e aceitar a inevitabilidade de uma força motriz do desenvolvimento: a liderança. “Construir o futuro pressupõe compreender o passado” é uma asserção óbvia. As conquistas territoriais e a navegação por “mares nunca dantes navegados” para “dar novos mundos ao Mundo” foram apenas possíveis porque os nossos antepassados se mobilizaram e se prepararam para lutar e ir mais além. Mas, não tenhamos dúvidas: a chave para o sucesso coletivo foi a capacidade de mobilização e orientação das vontades individuais. Se o mundo evoluiu tanto desde então, a liderança continua a ditar o sucesso das equipas e das empresas.

Liderar e motivar pessoas é, naturalmente, um princípio basilar ensinado nos cursos de gestão e inovação, mestrados e MBAs. Temos como adquirido que um bom gestor é aquele que sabe gerir “tout court”. Contudo, poucos são os que sabem, de facto, comunicar e liderar, especialmente, quando se trata de perfis criativos.

Vejamos: é crucial entender que os grandes avanços do mundo foram impulsionados por pessoas disruptivas. Mas também é verdade que liderar esses perfis requer não apenas saber gerir, mas, sobretudo, saber comunicar. Gerir é manter o funcionamento da organização estável e sustentável. Liderar é inspirar, é capacitar as pessoas a alcançarem o seu potencial. Sem uma liderança eficaz, mas inspiradora, as equipas criativas tendem a sentir-se frustradas e limitadas, o que, por sua vez, prejudica a inovação e o progresso da empresa como um todo.

Os “criativos”, como, frequentemente, são denominados, têm mentes diferentes. Para alcançarem a disrupção de pensamento, possuem, naturalmente, um mindset distinto. São pessoas especiais que veem além do óbvio e do imediato. Uma empresa que os tenha deve saber preservá-los e preservá-los passa por saber ouvi-los, compreende-los e guiá-los.

Há uma certeza que não deve ser menosprezada: em qualquer organização os resultados financeiros são fundamentais, afinal, sem faturação e sem crescimento não existem empresas rentáveis. Mas este objetivo visa apenas gerir pessoas e não liderá-las. O que com perfis analíticos pode funcionar, com equipas criativas será meio caminho para o fracasso.

Liderar perfis mais criativos versus analíticos pressupõe regras próprias. Os primeiros têm um estilo de aprendizagem e de trabalho que mobiliza o hemisfério direito do cérebro – mais visual, aleatório, emocional e um tanto impulsivo. Geralmente, são impulsionados por uma grande ideia e tendem a ignorar os detalhes. Por oposição, nos perfis analíticos, o recurso ao hemisfério esquerdo é mais acentuado, e, por isso, são mais verbais e lógicos. Preferem a ordem e um ambiente de trabalho formal. São mais estruturados e orientados para detalhe e lidam bem com pipelines. Naturalmente que sendo estes perfis tão diferentes, a liderança tem de ser, obrigatoriamente, distinta.

Os líderes, enquanto responsáveis pelo crescimento do negócio, devem orientar, de forma assertiva, as equipas criativas, transmitindo-lhes qual o objetivo final a atingir (o que dita o sucesso). Estas tendem a rejeitar a microgestão, sendo assim, se tiverem autonomia e liberdade para encontrar a melhor forma de alcançar um resultado bem definido, mais facilmente a meta será alcançada.

Todos temos Roadmaps e métricas, porém limitarmo-nos a um plano pré-definido e estático leva-nos a perder oportunidades paralelas. Assim sendo, o principal requisito é, sem dúvida, a abertura mental. Porém, se esta é primordial, estrutura e direção para atingir um objetivo são igualmente aspetos essenciais. Por outas palavras, conseguir o equilíbrio em canalizar boas ideias e esforços na direção certa é, provavelmente, o maior desafio de uma liderança. Ideias criativas e originais que não tenham um propósito objetivo terão, certamente, um impacto marginal numa organização.

A estes condicionalismos por si só exigentes, mas primordiais, junta-se um factor não somenos importante e limitador para as mentes criativas: o tempo. Mais conhecido, na gíria empresarial, como os malfadados timings e deadlines. Os criativos tendem simplesmente a ignorá-los porque, está claro para eles, as ideias e a perfeição não se coadunam com o respeito pelos horários e prazos rígidos. E, inevitavelmente, surge a dificuldade, por vezes, a aflição de se cumprir o calendário estabelecido. Mas, mais uma vez, o equilíbrio entre o que é crucial e o que é acessório é chave para o sucesso. Uma ideia não pode ser tratada como uma folha de cálculo ou um relatório. Naturalmente, tudo exige esforço e dedicação, mas os últimos são passíveis de ser planeados e geridos no tempo, enquanto as ideias são caprichosas e imprevisíveis e surgem quando menos se espera.

Não restam grandes dúvidas: só compreendendo e valorizando o trabalho criativo se consegue perceber que, muitas vezes (mas não sempre) o tempo pode ser subjugado por uma boa ideia.

Ao contrário do ChatGPT, que é conduzido com comandos simples e diretos, liderar pessoas será sempre muito mais complexo e exigirá sensibilidade em todos os momentos. No entanto, tal como o resultado das plataformas de IA é tanto melhor quanto a informação e a forma como é dada, também o resultado de uma equipa criativa será melhor se for não só bem direcionada como impulsionada.

Um líder orienta, constrói e confia, dá segurança e estabilidade, gere o tempo e multiplica-o, para que a equipa se concentre apenas naquilo que cada um faz de melhor – criar.

Então, como se lideram perfis criativos?

A solução é apenas uma: acarinhar a criatividade, proporcionar um ambiente onde a autonomia e a confiança sejam incentivadas e a liderança sirva como um guia flexível que mantém a direção em vez de um caminho imposto e linear.