Há mais RH para além dos trabalhadores?

Quando falamos em recursos humanos, em regra, estamo-nos a referir a todos os trabalhadores que desempenham as suas atividades em função de um contrato de trabalho, mais ou menos formal, com horário determinado e uma certa remuneração no final de cada período (normalmente, ao mês).

No entanto, existem outros recursos humanos aos quais devemos prestar atenção e que têm um papel determinante e definitivo, com um impacto forte na organização: os donos, os detentores do capital da Empresa.

Estes são, em Portugal, uma fatia bastante grande do quadro de pessoal das Empresas, porque cerca de 80% das Empresas são pequenas e microempresas, que têm até 10 trabalhadores e com uma enorme expressão nas economias locais e estão distribuídas por todo o território nacional.

No entanto, estes recursos humanos podem não ter acesso a alternativas de formação que são disponibilizadas aos trabalhadores por conta de outrem ou poderão existir outras razões que motivem o não aproveitamento destas sessões de formação.

Também ocorre que os donos destas pequenas ou microempresas não pretendem perder a sua autonomia ou que haja ingerência externa no futuro da sua companhia. E que, apesar de poderem ser agregadores e quererem pertencer a uma determinada associação, podem não querer dialogar ou estabelecer alguma ligação com outros gestores e donos de empresas, porque são suas concorrentes.

Daqui o relevante papel que as organizações e associações patronais ou setoriais podem desempenhar e, na minha opinião, não só na área da formação, mas em todas as áreas de serviços transversais e que são úteis a todos os empresários de pequena dimensão.

As associações patronais de um determinado sector, seja serviços ou indústria, mas principalmente nos sectores em que existe uma miríade de empresas de pequena dimensão, poderão (ou, até talvez, deverão) providenciar um conjunto de serviços de aconselhamento, de apoio e de prestação de serviços, a essas pequenas ou microempresas.

Será bem mais interessante e o custo poderá ser mais facilmente diluído para essas empresas do que terem serviços de apoio próprios.

Estou a referir-me, por exemplo, a disponibilizarem serviços de recrutamento especializados para contratar recursos humanos para o respetivo sector. Têm conhecimento do mercado, sabem que tipos de formação são requeridos pelos associados, quais os seus perfis alvo, provavelmente saberão melhor onde colocar a procura dessas competências, com que sazonalidade, etc. Terão, garantidamente, maior conhecimento deste mercado de trabalho que uma pequena empresa local.

Podemos, também, falar de gestores de Recursos Humanos que podem aconselhar a gerência dessas pequenas empresas sobre modelos organizativos a implementar, que conjunto de benefícios faz sentido preparar para o futuro, que medidas tomar relativamente a determinados processos, desde a admissão à saída, desde a cultura organizacional à avaliação de desempenho e outros temas da área de RH.

Podemos ir mais além e incluir serviços de contabilidade, de compras, de fiscalidade, etc., diria que as associações setoriais poderiam fornecer um conjunto de serviços equivalente ao que uma empresa de serviços partilhados disponibiliza para o grupo de empresas que serve, simplesmente com tarifas eventualmente diferentes e que façam sentido para o setor em que esta associação esteja inserida.

Seria uma forma de contribuir para a crescente formação dos gestores destas unidades, permitindo que cada um mantenha a sua independência, mas com a possibilidade de obterem formação específica sobre o setor e outras áreas adjacentes ou não, sobre gestão de empresas, sobre futuro e sobre como poderão atualizar o seu modo de operação, em várias áreas da sua atuação.

O modelo de retribuição desses serviços poderia passar por uma parcela de subscrição geral, ou seja, parte da quota seria para subsidiar este conjunto de serviços, ao que acresceria o princípio do utilizador-pagador e estabeleceria o preço final, podendo a associação pretender obter algum proveito pela disponibilização deste serviço (ou não). Depois, dependeria do tipo de associação, do seu número de associados, do que estabelecessem em termos de estatuto para este tipo e serviços.

Mas, acredito que seria uma forma de empresas pequenas e microempresas poderem ter acesso a um conjunto de serviços que incrementaria de forma absoluta o nível de gestão atual, abordando outras perspetivas de futuro e dando maior consistência ao tecido empresarial português.

Claro está, que apesar de disponibilizar estes serviços, as associações deverão garantir sempre a autonomia de cada uma das partes, dado que, na minha opinião, este será o fator mais decisivo para que a maior parte dos gestores e donos destas empresas possam recorrer a estes serviços. Perder a autonomia no seu negócio é irrecusável.