Política de Bem-Estar Parental para reter talentos: A Necessidade de incluir o cuidado com pais idosos no ambiente corporativo

Recentemente, em uma conversa informal com meu pai na fila de um banco, fui interrompida por uma senhora de 82 anos que, com uma leve preocupação no olhar, fez uma pergunta que gerou uma reflexão profunda: “É seu pai? Cuide bem dele!” Ela seguiu falando sobre a dificuldade de ser cuidada na velhice, mencionando que seu único filho, devido ao trabalho, não tinha tempo de acompanhá-la em momentos importantes, como um procedimento cirúrgico. Ela ressaltou que a empresa dele sequer oferecia políticas que previssem esse tipo de suporte. A conversa com essa senhora, apesar de breve, trouxe à tona uma questão que, muitas vezes, passa despercebida nas políticas de gestão de pessoas nas empresas: a necessidade de repensar os programas de bem-estar parental, considerando também o cuidado com pais idosos e dependentes.

Este relato não é apenas uma anedota, mas um convite à reflexão sobre como as organizações, especialmente em um cenário de envelhecimento populacional crescente, podem repensar suas políticas de bem-estar para não só reter talentos jovens, mas também para apoiar seus colaboradores que enfrentam o desafio de cuidar de pais idosos. Muitas empresas já adotam políticas de apoio a pais com filhos pequenos, como licenças parentais e horários flexíveis, mas ainda há uma lacuna significativa no apoio a colaboradores que precisam cuidar de familiares mais velhos ou dependentes.

O envelhecimento da população e a necessidade de novas políticas corporativas

O envelhecimento da população é um fenômeno global que tem se intensificado nas últimas décadas. No Brasil, a proporção de pessoas com 60 anos ou mais passou de 9,8% da população total em 2000 para 14,3% em 2021, segundo o IBGE. Esse processo tem implicações não apenas para a sociedade como um todo, mas também para o mercado de trabalho. Como resultado, muitas empresas precisam se adaptar à realidade de que seus colaboradores podem, em algum momento, ter que conciliar o trabalho com os cuidados necessários a um familiar idoso.

A legislação brasileira, conforme o artigo 229 da Constituição Federal, já prevê a responsabilidade dos filhos em relação ao cuidado de seus pais, mas, em muitos casos, as organizações ainda não oferecem a estrutura necessária para que seus colaboradores possam equilibrar suas obrigações profissionais com as responsabilidades familiares.

A falta de apoio nas empresas pode levar ao estresse emocional e à sobrecarga para o colaborador, resultando em afastamentos, queda na produtividade e até mesmo no desligamento do profissional. Além disso, o Brasil vive uma realidade onde profissionais das gerações mais velhas, como a baby boomer, continuam no mercado de trabalho por questões econômicas e sociais, aumentando ainda mais a necessidade de soluções de apoio para quem cuida de pais ou parentes mais velhos.

Uma política de bem-estar parental ampliada: Cuidando não apenas de filhos, mas de pais

Atualmente, as políticas empresariais de bem-estar parental estão fortemente centradas no cuidado com os filhos pequenos. Licenças maternidade e paternidade, horários flexíveis e programas de apoio ao cuidado infantil são comuns, especialmente em empresas que buscam atrair e reter talentos da geração millennial e geração “Z”. Contudo, poucos pensam naqueles que, após cuidar de seus filhos, acabam assumindo o cuidado de pais idosos ou parentes dependentes.

O apoio a colaboradores que cuidam de familiares idosos pode se manifestar de várias formas dentro das empresas. Algumas possíveis soluções incluem:

1.Licenças Especiais e Flexibilidade de Horários: Empresas poderiam adotar licenças para cuidados de pais e parentes idosos, assim como horários flexíveis ou a possibilidade de trabalhar remotamente para que o colaborador possa cuidar do familiar, sem prejudicar suas obrigações profissionais.

2.Programas de Apoio Psicológico e Emocional: O estresse relacionado ao cuidado de um familiar idoso pode ser debilitante. Oferecer suporte psicológico, terapias online ou grupos de apoio pode ser uma maneira eficaz de ajudar os colaboradores a lidarem com as pressões emocionais dessa tarefa.

3.Parcerias com Instituições de Cuidados e Assistência Domiciliar: Empresas podem formar parcerias com hospitais, clínicas de cuidados domiciliares ou casas de repouso, oferecendo descontos ou facilidades para seus colaboradores que necessitem desse tipo de assistência.

4.Capacitação sobre Cuidado com Idosos: Oferecer treinamentos para os colaboradores sobre cuidados com idosos, como lidar com doenças crônicas, administração de medicamentos e a gestão de emergências médicas, pode ser uma forma de capacitar os colaboradores e reduzir a ansiedade relacionada à responsabilidade de cuidar de um familiar.

Impactos Positivos para as Organizações

Adotar políticas que promovam o bem-estar parental ampliado, contemplando também o cuidado com pais idosos, traz benefícios tanto para os colaboradores quanto para as próprias empresas. Quando os funcionários se sentem apoiados e compreendidos pela organização, sua satisfação no trabalho tende a aumentar, resultando em maior lealdade e, consequentemente, em uma redução da rotatividade. Além disso, essa medida pode ser um diferencial competitivo para a atração de talentos, especialmente em uma época em que os valores de bem-estar e responsabilidade social são cada vez mais valorizados pelos profissionais.

Investir em políticas de apoio à família, que não se limitem apenas aos filhos, é um caminho para as empresas se tornarem mais humanizadas e sustentáveis no longo prazo. Curiosamente, uma excelente referência na implementação de uma política de bem-estar parental que também abrange o cuidado com pais idosos foi desenvolvida por um dos maiores bancos privados do Brasil. O banco desenvolveu uma série de iniciativas voltadas para o bem-estar dos seus colaboradores, incluindo políticas específicas para o cuidado com familiares idosos.

A sociedade está envelhecendo, e as empresas que se anteciparem e se prepararem para apoiar seus colaboradores que lidam com esse desafio terão um diferencial importante na retenção de talentos e na construção de uma cultura organizacional sólida e empática.

Conclusão: A Hora de Repensar é Agora

A conversa com a senhora de 82 anos foi um lembrete valioso. É hora de as empresas repensarem suas políticas e de se adaptarem ao novo contexto social e econômico. Aqueles que liderarem essa mudança estarão contribuindo para um ambiente corporativo mais inclusivo, produtivo e humano.

Referências:
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Projeção da População do Brasil por Sexo e Idade para o Período de 2020 a 2070. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/populacao/9109-projecao-da-populacao.html

Nota Informativa nº 5 MDS/SNCF. O envelhecimento e o direito do cuidado. MDS, 2023. https://www.gov.br/mds/pt-br/noticias-e-conteudos/desenvolvimento-social/noticias-desenvolvimento-social/mds-lanca-diagnostico-sobre-envelhecimento-e-direito-ao-cuidado/Nota_Informativa_N_5.pdf