Como as empresas reagem ao Covid-19 – o caso de Moçambique

Poderia dedicar estas linhas para escrever um tema específico no âmbito da gestão de pessoas. Mas em tempos de Covid-19, todas as reflexões giram em torno desta temática. As questões comummente levantadas pelas pessoas e pelas empresas são: o que fazer para sobreviver à crise? Como será o futuro após a Covid-19? Será que voltaremos à normalidade?

Certamente ainda é demasiado cedo para afirmar como será o período pós Covid-19. Há variáveis da equação que permanecem em aberto, designadamente a resposta à questão quando é que a doença será completamente controlada ou extinta. Todos ansiámos que esse momento chegue tão rápido!

Gestão da crise

O COVID-19 teve um impacto à escala mundial

Para já podemos afirmar que o ano 2020, apelidado de ano gémeo, ficará marcado para sempre na história da humanidade. É caracterizado pela ocorrência de um fenómeno raro, de dimensão planetária e com impacto extremo na economia dos países. Não há nação alguma no mundo que não sinta os efeitos nefastos causados pela Covid-19.

Para minimizar os impactos da pandemia, as empresas foram forçadas a reagir rapidamente, através da implementação de acções diversas, customizadas aos seus contextos. Em Moçambique, e em muitos outros países, a cronologia dessas acções corresponde a três etapas principais: O período pré-Covid-19, o período durante a Covid-19 e o período pós a Covid-19.

Em qualquer uma destas etapas, o papel das equipas de recursos humanos e de comunicação corporativa é crucial. É imperioso orientar e apoiar os colaboradores na gestão da emergência, da ansiedade e das incertezas, estimular e transmitir otimismo nos diferentes níveis das organizações.

Período pré-COVID

A primeira etapa, antes da Covid-19, corresponde ao período anterior ao registo do primeiro caso positivo em Moçambique, a 22 de Março de 2020. Nesta fase, o foco principal das empresas foi a implementação de acções que contribuíssem para inibir a entrada do inimigo invisível, baseando-se na experiência dos países com casos positivos já registados, bem como nas recomendações das autoridades nacionais de saúde e da Organização Mundial da Saúde (OMS).

Foi mandatário ler o cenário global para aplicar medidas assertivas. Essa reação foi tão rápida! Era como se o sino tocasse e todos fôssemos a correr à sala de aulas para realizar o exame mais importante da classe frequentada.

As acções implementadas vão desde a constituição de comités de crise, com a responsabilidade de centralizar a tomada de decisões de emergência, até à definição de planos contingenciais para responder à pandemia.

Os canais internos de comunicação são reforçados e as equipas de comunicação desdobram-se em produzir mensagens de todo o tipo, para explicar o que é a Covid-19, quais as formas de contágio, como previr, partilham o estágio da situação global e local, etc.

Os planos de acção de saúde e segurança nos locais de trabalho são revistos e rapidamente são reforçados os canais, meios e equipamentos de higiene pessoal e colectiva. Algumas empresas determinam o cancelamento ou restrição de viagens locais e/ou internacionais.   

Período durante COVID

A segunda etapa corresponde ao período durante a pandemia da Covid-19. É das fases mais críticas e é nesta que se encontram muitos países ou estados. Nesta fase, o principal foco é continuar a cuidar das pessoas, incluindo o tratar de profissionais doentes. As empresas são verdadeiramente desafiadas a colocar em prática um dos princípios mais importantes da gestão. É o momento de demonstrar, através de acções concretas, que “as pessoas são o recurso mais importante das organizações”.

As acções a implementar incluem o reforço de medidas preventivas, a incorporação de todas as medidas decretadas pelos governos, para além de assegurar as operações residuais do negócio. É nesta etapa que o país declara, a 30 de Março de 2020, o Estado de emergência de nível 3, com o objectivo de achatar a curva epidemiológica e reduzir a progressão da doença.

As medidas implementadas incluem afastamento de profissionais vulneráveis ou de risco (que na definição da OMS são os trabalhadores com mais de 60 anos, mulheres gestantes e doentes crónicos). É implementado o teletrabalho, com o objectivo de reduzir aglomerados nas empresas. O cenário de escritórios panorâmicos e em open space é temporariamente substituído por uma diversidade de pontos isolados de trabalho. Executivos, gestores e equipas ficaram confinados em seus apartamentos. É de lá que se gere a crise e o negócio, com a agilidade que o momento impõe.

A regra de ouro é permanecer e trabalhar no domicílio. Mas o teletrabalho não é varinha mágica para curar todos os males. Para as áreas ou actividades sem possibilidade de realização de trabalho remoto registam-se dois cenários:

O primeiro é o enceramento temporário de actividades. Enquadram-se neste cenário as actividades classificadas como não essenciais no decreto governamental que fixa o estado de emergência. São disso exemplo os estabelecimentos comerciais de diversão e equiparados. Outras actividades, ainda que fora daquele critério, enceraram temporariamente as actividades por efeito da aplicação das medidas restritivas de entrada e saída de pessoas, limitação de circulação, suspensão e cancelamento de vistos. São exemplo desta realidade as áreas de turismo, restauração e alguns segmentos do sector dos transportes.

O segundo cenário é de operação parcial ou condicionada das empresas: enquadram-se neste os ramos de actividade como a indústria, o comércio, serviços bancários e outros. Estas áreas mantém suas operações ativas, com a obrigatoriedade de reforço das medidas preventivas, que incluem a redução do efectivo para um terço e a rotatividade laboral. Algumas unidades económicas redirecionam a sua actividade para a produção de insumos de combate à pandemia. Regista-se um espírito de solidariedade sem precedente. A luta contra a Covid-19 é colectiva. O interesse coletivo sobrepõe-se a qualquer outro e até une os concorrentes.

As empresas que integram o ramo de actividades tipificadas como essenciais (por exemplo os serviços médicos, segurança pública, abastecimento de água e electricidade) continuam a funcionar em pleno e com o desafio assegurar que os bens essenciais ficam disponíveis para a maior parte da população.

Período pós-COVID

O próximo destino de Moçambique, e de muitos outros países, é a terceira etapa, após a Covid-19. Já gera expectativas e alguns prognósticos de cenários futuros. Vários círculos de opinião no mundo são unânimes em afirmar que não haverá um retorno à antiga normalidade. Temos de nos preparar para uma nova era. Por isso, um dos desafios das empresas é começar a preparar a transição e o retorno seguro ao trabalho, que acreditamos será gradual. Queiramos ou não, a forma de ser e estar das pessoas não será a mesma. Consequentemente, as necessidades dos clientes, a postura dos fornecedores, as expectativas dos acionistas também poderão mudar. As empresas terão de se reinventar e os seus colaboradores preparados para lidar com o novo contexto.

Com as variáveis actualmente existentes, alguns cenários são visíveis: a constante preocupação pela sustentabilidade e sobrevivência das empresas, possíveis alterações na estruturação dos processos, nas relações de trabalho e possíveis de revisões legislativas.

Sustentabilidade futura

Focadas na sua sustentabilidade futura, as empresas trabalham na revisão de estratégias. É preciso pensar no curtíssimo prazo, mas com uma visão futura pois as acções de hoje impactam o amanhã. Por exemplo, a forma como cuidamos das nossas pessoas hoje na crise pode reforçar ou retrair a nossa marca de empregador.

As organizações empresariais, através da Confederação das Associações Económicas de Moçambique (CTA), desdobram-se na avaliação sectorial dos impactos da Covid-19. O objectivo é elaborar e endereçar propostas de medidas de alívio ao Governo. A acção mostra-se relevante para garantir continuidade das actividades das empresas e salvar postos de trabalho.

Ainda no período pós Covid-19 é também provável que as relações de trabalho registem alterações. Por exemplo, para algumas áreas ou funções, o teletrabalho veio para ficar. Esta mudança obrigará à incorporação desta modalidade de trabalho em diversas matérias trabalhistas como por exemplo o âmbito dos acidentes de trabalho, flexibilização de tempos de trabalho, revisão dos critérios de remuneração, de medição da performance, etc. É também provável que pluralidade de empregos cresça. Por isso, é também previsível que ocorra uma corrida legislativa própria de períodos pós crise, para adequar as leis ao novo contexto nas relações de trabalho.

Enfim, a crise é uma oportunidade de nos reinventarmos e de grande superação. Em poucos meses, a Covid-19 está a demonstrar que as etapas tradicionais dos processos de mudança podem ser encurtadas e aceleradas. Efectivamente, as pessoas e as organizações têm uma grande capacidade de adaptação, quando colocadas em contextos extremos. É o instinto da sobrevivência! Isto só nos lembra que teoria evolucionista de Charles Darwin é bem actual.

Somos todos verdadeiros heróis da adversidade!