Happiness Manager – precisamos deles?

Desde o momento em que comecei a minha aventura como gestor de felicidade em 2017, até hoje, tantas foram as vezes que me fizeram as perguntas “o que é ser Happiness Manager?”; o que faz um “Happiness Manager?”; “Qual a maior importância ou quais os maiores desafios para um Happiness Manager?”. 

Escolho não responder a essas questões, tantas vezes já respondidas e quase sempre com uma tónica positiva e de esperança, mas sim trazer-vos um registo mais pessoal, pequenos lampejos e várias questões e visões reais e objectivas que eu tenho do cargo, da figura e da pessoa que o representa.

Passados 3 anos e com muitos mais HM no mercado de trabalho em Portugal, muitas vezes ainda pergunto-me realmente se um HM é realmente necessário às organizações ou se estas agora apoiam-se nesta “nova” figura e no poder de alcance de uma pessoa que joga tanto no lado de quem decide como no lado de quem não tem poder de decisão, para continuar a controlar os colaboradores, o chamado proletariado e perceber as suas intenções ou motivações, nomeadamente quando estão descontentes.

Tive o privilégio e a audácia de ser o 1º Happiness Manager em Portugal. Quando foi criada a função ninguém sabia o que era ou o que representava. Quando apresentei a função à direcção da empresa onde iniciei o cargo, o desconhecimento em relação aos propósitos do papel que iria desempenhar e como atingiria os objectivos a que me propunha levaram esta a dar pouco crédito ao título e à responsabilidade que o mesmo empregava. Obviamente, com o reconhecimento público do tema e da função, que volvidos estes anos, a desconfiança foi ultrapassada e o projecto da gestão de felicidade interna da vasta maioria das empresas em Portugal tornou-se vencedor principalmente na área das IT.

Desde o primeiro momento desta aventura que venho superando dogmas, gozos e ignorância face a um título profissional que nada mais é do que pomposo, pois existem muitos HM por aí espalhados que não se dão a conhecer por este título. Falo dos varredores de rua, falo dos professores, falo dos profissionais de saúde e tantos outros que merecem ser mencionados pela entrega e dedicação ao bem-estar e felicidade do próximo.

Estamos inseridos numa sociedade em que pedir ajuda ainda é visto como sendo um acto de fraqueza, de incapacidade. Pedir ajuda no local de trabalho então é algo impensável e o receio de ser visto como de menos ou alguém que é um problema para uma estrutura organizacional é algo que ninguém pretende ou deseja. O que acontece é que o mundo é feito de pessoas. As estruturas organizacionais sejam elas de cariz profissional ou de outra natureza são feitas de pessoas e felizmente estas não são máquinas. Trazem sentimentos, emoções, pensamentos e caráter associados a si. Como Happiness Manager, mas primeiro como Fábio, eu queria que a “minha organização” aquela que eu represento, me conhecesse. Soubesse quem eu sou e no processo que fossem encontradas as pontes entre os valores e missões que esta defende e os valores e missões defendidas por mim. Não me podia esquecer nunca que ia advogar todos estes valores, missões e objectivos perante as minhas pessoas. Actuar como mediador de ambas as partes. Quando nos queremos comprometer e criar valor, temos de nos preocupar com aquilo que somos e com aquilo que representamos para quem nos rodeia.

O Happiness Manager é a bússola, o Norte, digamos que o guia e a orientação sensorial da empresa pois é a materialização humana da empresa. É a cara, a voz e em quem as pessoas vão escolher acreditar ou não. Quando escolhemos colocar uma figura deste tipo numa estrutura organizacional, quem decide tem que ter noção que está a criar um espaço de opinião dentro da empresa, um fórum. O Happiness Manager é um mensageiro e um facilitador, um agente isento do bem-comum. Não pode nunca ser visto como arma de arremesso ou controlador de massas. Isso não é happiness e muito menos management.

Num mundo cada vez mais de rápido consumo e que muda a cada segundo, se tirarmos verdade e idoneidade ao que somos e principalmente ao que somos enquanto fazemos ou desempenhamos uma missão ou um cargo, tornamo-nos acéfalos e meras ferramentas sem opinião, sem auto-controlo e poder de decisão. O gestor de felicidade serve de barómetro e mediador de todas as adaptações que necessitem ou que precisem de ser feitas, sempre com a tónica que todos os processos têm de ser humanizados. Se tivermos uma pessoa descontente no local de trabalho e esse descontentamento levar a uma falta de produtividade e compromisso dessa pessoa e que poderá afectar os seus colegas directos e a organização como um todo, é função do HM ajudar a perceber a raiz do problema e em última instância se nada puder ser feito para melhorar a vista dessa pessoa dentro da organização, tem de a ajudar a sair. Tem de a ajudar a procurar um emprego, outra ocupação profissional que a permita ser mais feliz e produzir mais. Não podemos simplesmente despedir alguém sem conhecer as causas que podem estar a levar a uma queda abruta da sua presença efectiva enquanto colaborador de uma empresa e abandoná-la, desistir dela. E se fossemos nós? E se fosse connosco? Tal como disse em cima, quando comecei este cargo foi minha intenção que quem decidisse se eu o iria desempenhar ou não conhecesse a pessoa que eu sou pois continuaria a sê-lo de futuro. É a mesma leitura que faço em relação a todos os colegas e demais colaboradores das empresas com quem trabalho.

A importância do HM nas organizações é realçada quando a visão e a realidade vivida colidem positivamente. E tal só é possível com continuidade, com crença nas pessoas e que estas precisam de estar bem consigo mesmas, bem no local onde passam mais de 80% do seu tempo e com vontade de contribuir para o aumento desse bem-estar. Como HM é importante que disponibilize meios e alternativas dentro da estrutura da própria empresa para que as pessoas possam recorrer, obter ajuda sem terem de a pedir. “O que é da empresa é meu para me ajudar. É meu para cuidar”.

Festas, gabinetes de escuta activa, mindfulness, ajuda financeira para adquirir material escolar, formações profissionais pagas, ajuda na procura de emprego para os cônjuges/filhos dos colaboradores, apoio a expatriados, refeições oferecidas, políticas de voluntariado e responsabilidade social, tele-trabalho, criação e adequação do salário emocional de cada um e mais.

Todas estas acções só são possíveis se houver pessoas que garantem que tudo isto acontece sempre e não em alturas críticas ou porque “nos apetece”. Todas estas acções só são possíveis se houver dinheiro alocado para uma correcta e efectiva gestão de pessoas e não estou a falar do dinheiro para pagar salários. Estou a falar do dinheiro necessário para gerir todas as pessoas que existem dentro de uma organização, pessoas essas que são todas ímpares bem como o valor que agregam à empresa. Todas estas acções só são possíveis se quem “manda” acreditar realmente nas pessoas e não nos dividendos que um bom marketing externo sobre esta “moda” pode gerar.

Caso contrário é apenas publicidade, provavelmente inócua e enganosa. Tive oportunidade de trabalhar com empresas em Portugal e no estrangeiro nos últimos 3 anos como HM e consultor de gestão de felicidade e do que vi, vivi e ainda vejo, posso afirmar que a maioria das empresas não acredita nas suas pessoas. Até pode gostar e preocupar, mas não acredita, pois, todas as medidas que são tomadas são de carácter reactivo e planear reacções normalmente não dá bom resultado. “Se correr bem, somos os melhores e tivemos visão, se correr mal como não há nenhum plano de continuidade não temos de nos comprometer com nada”.

Em tempos de pandemia, em termos de mudança de paradigma social, em tempos de tele-trabalho, em tempos de isolamento pessoal e profissional, mais do que nunca é importante que as pessoas acreditem umas nas outras e se uma empresa decide apostar num cargo tão intangível e sensitivo, num cargo tão pesado a nível emocional e de conduta ética e moral, que o faça de modo transparente com continuidade e acima de tudo com verdade. Caso contrário, não precisam de nenhum Happiness Manager e poderão fazer campanhas de marketing com outros produtos e serviços que realmente o sejam…e acima de tudo que existam. Que sejam verdadeiros. Ser gestor de felicidade é também ver o outro lado e abordá-lo. O menos bonito. O difuso. O triste.