Não há melhor profissional que um voluntário competente!

Quem me conhece, sabe que utilizo várias vezes esta frase pelo valor que lhe atribuo, porque ao longo de 13 anos, dedicados a atividades amadoras e voluntárias, em que, entre as quais, fui jogador de futebol federado (durante 10 anos) e dirigente associativo (durante 3 anos), cruzei-me com profissionais incríveis, todos eles não remunerados.

No mercado de trabalho há vários anos, já fora deste mundo e com o devido distanciamento, ao trabalhar diariamente com matérias como políticas de remunerações e incentivos, engagement, atração e retenção de talento e muitos outros temas conexos, fico sempre preso a algo, algo que me tem provado ser o gatilho mais poderoso para atrair, satisfazer e reter os melhores talentos: Missão e Propósito (no âmbito individual e coletivo).

Durante estas experiências, tive a felicidade e a oportunidade de assumir alguns papéis de liderança, como capitão de equipa, no Sport Futebol Damaiense, ou Presidente da Direção da Associação de Estudantes, da Escola Superior de Ciência Empresariais, do Instituto Politécnico de Setúbal. Em ambas as experiências, pude constatar que a forma como um voluntário, que vê propósito no que faz e encara a missão como sua, consegue entregar resultados e superar barreiras constantemente é absolutamente incrível e talvez seja o melhor case study que as empresas podem explorar para construir o seu EVP (Employer Value Proposition).

Se no futebol amador pude desenvolver soft skills, que considero cruciais para a minha vida pessoal e profissional, aprendendo a importância de colocar os objetivos da instituição e do grupo de trabalho à frente dos objetivos individuais, na Associação de Estudantes, tive a oportunidade de vivenciar e aplicar na prática esta visão, num ambiente mais idêntico ao mundo empresarial.

Foi neste universo, que conheci algumas das mais talentosas, comprometidas e competentes pessoas com quem lidei. E não é certamente por acaso, que de entre um grupo alargado de pessoas, hoje quase todos têm uma bonita carreira profissional e muitos são profissionais de referência. Constato ainda, que a resiliência e a capacidade de superação são competências-chave nestes ambientes e que quando aplicadas no mercado de trabalho marcam a diferença.

“a forma como um voluntário, que vê propósito no que faz e encara a missão como sua, consegue entregar resultados e superar barreiras constantemente é absolutamente incrível…”

O grau de compromisso que se encontra neste tipo de ambiente é incrível, o que as pessoas deixam de fazer para se dedicar a uma causa e os resultados e o prazer que tiram disso, chega a ser de certa forma inexplicável por palavras. Mas como em tudo, não chega querer fazer, há que fazer bem, e foi isso que mais me surpreendeu mais na AEESCE, onde o nível de exigência, rigor e compromisso atingiam níveis muito elevados
para um grupo de jovem estudantes, onde ninguém era remunerado. A excelência de gestão e serviço prestado aos estudantes e comunidade eram reconhecidos e a competência era evidente.

Continuo a afirmar (para espanto de muitos), que ser Presidente da Direção da AEESCE foi de longe, até hoje, o maior desafio profissional da minha vida. Contextualizando, tinha 21 anos e geria uma equipa de 32 pessoas, representando aproximadamente 2100 estudantes, de forma direta (ESCE), e cerca de 6000 de forma indireta (IPS). Em breve, escreverei mais sobre este tema e sobre a forma como ainda me parece não ser claro para o tecido empresarial a escola de talentos que se consegue encontrar neste tipo de instituições juvenis.

Quando alguém, que é voluntário ou remunerado, se obriga a fazer algo bem feito “só” porque é assim que deve ser feito, está mais próximo de ser um profissional diferenciado. Acredito que nem tudo tem de ser feito na expectativa de se receber algo em troca de forma direta, pelo contrário, pode e deve ser feito porque é assim que faz sentido.

O denominado brio profissional e a competência em estado puro, revelam-se na forma como atuamos, seguindo valores e princípios e não necessariamente metas e recompensas.

Claro que em tudo o que fazemos, inclusive nestas atividades voluntárias, temos um objetivo individual, seja ele aprender, ajudar alguém ou fazer o que se ama, mas não é assim ou não deveria ser assim também na nossa carreira profissional?

Quando se tem um verdadeiro propósito, as pessoas são habitualmente auto motivadas, determinadas e focadas, cabendo ao líder não o papel de motivar, mas sim de orientar, desafiar e contribuir para o desenvolvimento individual de cada elemento da sua equipa. Em tom retórico, pergunto-vos, porque é que parece tão raro, no mercado de trabalho, encontrar esta auto-motivação nas pessoas? Será um problema
das pessoas? Será falta de formação? Ou será das empresas e dos seus líderes? Será falta de propósito? Ou apenas se trata de ter o propósito errado ou desalinhado?

Uma eventual resposta a estas questões, que me preenche o pensamento, é que o que separa habitualmente estas atividades voluntárias da nossa profissão, que para além da retribuição financeira inerente, está normalmente no propósito individual perante as coisas. Se me é permitido generalizar, acredito que no voluntariado, estamos quase sempre mais preocupados em dar do que em receber, e na verdade, no final, acabamos
sempre por receber muito mais do que aquilo que damos.

Por outro lado, sinto que muitas vezes no mercado de trabalho, todos estamos muito importados em receber e nem sempre tão importados em entregar aos outros, o que é quase sempre um travão ao nosso próprio desenvolvimento e dos que nos rodeiam.

Como digo muitas vezes a quem trabalha comigo, acredito que, como em tudo na vida, primeiro precisamos de nos dar a conhecer para depois sermos reconhecidos. O sentido de missão é essencial para sermos bem-sucedidos, não termos medo de nos entregarmos e de tornarmos a marca que representamos também a nossa marca, vestindo verdadeiramente a camisola. Este commitement e engagement leva a altos
desempenhos e permite tirar maior prazer do nosso trabalho.

Ao longo dos tempos, tenho assistido a uma relação entre empresa e empregado, que parece tender a seguir o mercado da oferta e da procura, onde quem está em vantagem dita as regras e a outra parte adapta-se e depois o jogo vira. Em tudo na vida, acredito no poder do equilíbrio, e nesta relação laboral, como em todas as outras, ambos devem esforçar-se para que resulte, havendo entrega, compromisso, lealdade, transparência e acima de tudo dedicação para que a mesma possa ser duradoura, mas acima de tudo ser feliz.

Esta reflexão leva-nos a temas que irei abordar em futuros artigos, entre eles o poder do Personal Branding, que se constrói muito mais através do que se entrega do que daquilo que se recebe em troca, tendo a credibilidade e a notoriedade papéis cruciais neste conceito.

O desafio que vos deixo é que reflitam sobre este tema, enquanto gestores, líderes, liderados, colaboradores e pessoas, percebendo o papel central que cada um de nós tem nesta mudança tão importante que levará a que o propósito das coisas seja mais que financeiro e permita a todos viver experiências mais felizes e enriquecedoras.