O poder transformador daquilo em que acreditamos

“Não divido o mundo entre os fracos e os fortes, ou entre sucessos e fracassos […] divido o mundo entre os que aprendem e os que não aprendem.” Benjamin Barber.

Se houve ano a pôr-nos à prova, 2020 foi o ano. Se antes sabíamos que não podíamos cruzar o mar, parados só a olhar para ele, este ano muitos de nós descobrimos que conseguíamos nadar, quando de súbito, nos vimos lançados para a água. Dois mil e vinte revelou-se um grande mestre. Exigente, mas um mestre.

Quem está no mundo da formação comportamental, na área do chamado Learning & Development, sabe que muitas vezes os grandes Everest desta vida não estão fora de nós, mas acima do pescoço e entre duas orelhas.

Podemos falar de aprender a usar novas ferramentas de trabalho, de boas práticas de trabalho remoto, de como estimular a colaboração, desenvolver a resiliência ou a organização pessoal, que a questão de fundo vai ter sempre ao mesmo: o que pensamos e as crenças que desenvolvemos e alimentamos.

Não estávamos preparados, mas a pandemia não nos pediu licença. Impôs-se no nosso quotidiano trazendo com ela disruptura e ansiedade. Muito do que tomávamos por garantido desapareceu, perante o nosso choque: “Isto não pode estar a acontecer!”

Tomámos consciência de uma crença muito comum e dolorosamente debilitante: As coisas devem desenrolar-se como prevemos e as pessoas devem portar-se de determinada maneira. Se isto não acontece, é terrível, e as pessoas são horríveis, e nada disto é justo!

Se calhar está a pensar que nunca disse nada parecido… O mais provável é que já o tenha pensado e que, mesmo sem se ter dado disso conta, que tenha acreditado nisto. Claro que todos sabemos que o mundo prega partidas e que a vida não é sempre justa, certo? Nós sabemos que o mundo não é justo, mas ficamos revoltados quando ele é injusto connosco. É que ao que parece acreditamos que o mundo deve ser justo para nós em particular. Isto é racional? Claro que não! E ajuda em alguma coisa? Nada! A próxima vez que der por si a pensar “Que raio fiz eu para merecer isto?”, lembre-se que está a fixar-se novamente numa falsa ideia de como o mundo e a vida devem ser.

A nossa mente é uma ferramenta poderosa! As coisas que pensamos acerca de nós mesmos e daquilo que nos acontece, tanto podem ajudar-nos a progredir e a navegar tempos difíceis, como podem ser um fardo que impede ou atrasa o nosso progresso.

Compreender a ligação entre crenças e comportamentos é perceber como podem as crenças ajudar-nos ou limitar-nos.

Carol S. Dweck, professora de Psicologia na Universidade de Stanford, é conhecida pelo seu trabalho sobre o poder e influência do nosso mindset, a atitude mental com que abordamos a vida. O trabalho de Dweck mostra o poder das nossas crenças mais básicas. Quer sejam conscientes ou subconscientes, estas crenças afetam fortemente o que queremos e se temos sucesso em obtê-lo.

Segundo Dweck, o nosso mindset não é um mero traço de personalidade, na realidade é o fator determinante por trás do nosso êxito pessoal e profissional. A nossa atitude mental tanto pode impulsionar-nos como pode impedir-nos de realizar o nosso potencial.

A autora distingue dois tipos fundamentais de atitudes mentais: a fixa e a progressiva. Os que têm a primeira acreditam que o talento e as capacidades são definidos à partida e não se alteram ao longo da vida. Por outro lado, os que têm uma atitude mental progressiva acreditam que o talento pode ser desenvolvido, com tempo e persistência. A atitude mental fixa é o caminho para a estagnação e a desmotivação. A atitude mental progressiva é o caminho da oportunidade e do sucesso.

Ainda que os benefícios da mentalidade progressiva (growth mindset) pareçam evidentes, a realidade é que muitos de nós, em certas situações, apresentamos uma mentalidade fixa.

O trabalho de Dweck levanta questões importantes sobre a ligação entre aquilo que acreditamos e aquilo que fazemos. Se acreditamos e afirmamos algo como:

“Não sou uma pessoa criativa”

“Não tenho apetência para línguas estrangeiras”

“Não tenho jeito para a tecnologia”

Estas crenças fazem-nos evitar situações em que tenhamos de usar estas competências, fazem-nos evitar experiências que possam resultar em fracassos, ou que nos façam sentir menos bem. Como resultado, retiramos a nós mesmos a possibilidade de aprender, de praticar e, consequentemente, de evoluir.

Quando pensamos na aprendizagem ao longo da vida e nos desafios que certas situações exteriores a nós nos impõem, reconhecemos o quanto é importante desenvolver, em nós e nos outros, uma mentalidade de crescimento.

A aprendizagem ao longo da vida implica estar aberto às oportunidades para aprender. Podemos ser todos, com motivação suficiente e trabalho árduo, uns génios como Einstein ou Mozart? Não. Todavia, o que é também verdade, é que o verdadeiro potencial de uma pessoa não é determinável – é impossível prever o que pode ser realizado com anos de paixão, trabalho e treino.

Então, como podemos cultivar uma mentalidade progressiva se ela não surge naturalmente? E como podemos mantê-la se já a temos? Listo abaixo cinco ideias essenciais para pô-lo na direção certa.

  1. Pense em si como um trabalho em progresso. Se quer desenvolver novas crenças sobre si, se deseja ser melhor líder, melhor pai/mãe, melhor profissional, não se fixe no resultado, mas no processo. Não é o resultado que o define. O que vai fazer a diferença é a sua persistência, a sua dedicação. Aristóteles disse: “Nós somos aquilo que fazemos repetidamente. Excelência, portanto, não é um ato mas sim um hábito.”. São as suas ações diárias que vão mudar as suas crenças acerca de si próprio.
  2. Centre-se nos pequenos passos. Comece com as coisas mais pequenas e mais fáceis. A meta é grandiosa? Segmente-a! A vida é feita de uma sucessão de pequenos passos e de inúmeras escolhas. Escolhas que nos parecem tão inócuas e insignificantes que tendemos a desvalorizá-las. Preste atenção às escolhas que fizer HOJE! O seu “Eu futuro” vai agradecer-lhe por algo que começou a fazer hoje. Escolha bem!
  3. Em vez de procurar a perfeição, procure a MELHORIA. Se estiver atento, pode encontrar oportunidades de melhoria em todo o lado. Desenvolva uma cultura de melhoria contínua. Adicione todos os ganhos marginais, focalize-se na progressão ao invés da perfeição. Hoje um pouco melhor do que ontem, amanhã melhor do que hoje.
  4. Não fique à espera de se sentir confiante para começar. Se ficarmos à espera de nos sentirmos confiantes ANTES de avançar num qualquer projeto, corremos o risco de ficarmos para sempre à espera. A confiança é a recompensa que ganhamos DEPOIS de fazermos o que nos desafia.
  5. Pense: SER – para FAZER – para TER. A mudança começa em nós, de dentro para fora. Acreditamos vezes de mais na sequência TER – FAZER – SER. Se eu tiver X, então posso fazer Y, para ser Z. Quando eu tiver isto… Posso fazer… E finalmente serei… – Isto é um engano tremendo! Uma forma de não entrarmos em ação. Também uma forma de desresponsabilização, de nos colocarmos do lado de fora, do lado do efeito. A mudança começa com outra ordem: SER – para FAZER – para TER. Pense que pessoa é quando acredita no Ter – Fazer – Ser? Que pessoa quer ser? Que pessoa escolhe SER a partir de agora?

O meu trabalho tem sido sobre desenvolvimento, aprendizagem e mudança de comportamentos. A mudança de atitude mental é mais do que seguir umas dicas. Tem a ver com encarar as coisas de uma forma diferente. Aquilo em que acreditamos influencia o que pensamos, influencia como nos sentimos e como atuamos. Como atuamos tem impacto nos nossos resultados e estes vêm reforçar aquilo em que acreditamos. É um ciclo permanente. Se não desenvolvemos, acerca de nós, dos outros e do mundo, crenças que nos servem e impelem a ser as pessoas que precisamos e queremos ser, não vamos ter os comportamentos e os resultados que desejamos. Aquilo em que acreditamos tem o poder de tornar-nos melhores pessoas e isso tem impacto no nosso progresso coletivo e nos mais diversos contextos – das famílias, às empresas, às escolas. Desenvolver uma mentalidade de crescimento não é apenas algo bom, é essencial para abraçarmos os desafios de 2021 com outra confiança.