Pessoas 1 – Microgestão 0
“Pagava para continuar a trabalhar em casa” – disse-me uma amiga outro dia.
Como a compreendo!
Depois de trabalhar muitos anos da forma tradicional – com algumas frustrações e infelicidade pelo meio – surgiu-me a oportunidade de trabalhar remotamente.
Para mim, foi a cereja no topo do bolo!
Não podia haver melhor:
- a liberdade de gerir o meu tempo;
- de levar os miúdos à escola sem pressas;
- não me meter na boca do lobo do trânsito;
- almoçar em casa;
- ir buscar os miúdos à escola e levá-los às atividades;
- ajudá-los nos TPC´s e a estudar para os testes;
- ir ao supermercado sem filas;
- dar um passeio com o cão.
Em resumo: trabalhar mas usufruindo da vida, em especial da minha família.
No segundo confinamento e a partir do momento em que as crianças regressaram à escola, os colaboradores puderam, finalmente, sentir a realidade do teletrabalho.
Com a experiência que já vou tendo de trabalhar a partir de casa (ou de qualquer outro sítio), saliento alguns fatores que é preciso ter em consideração:
- ser organizado(a) – se estiver em casa (e se for mulher) há sempre “mais uma coisa” que podemos fazer e que demora 5 minutos – sim, estamos em casa, mas é necessário respeitar as horas de trabalho;
- se possível, arranjar um espaço dedicado somente ao trabalho – é importante que não trabalhe na mesa da cozinha ou de jantar, mas que tenha um espaço só seu;
- gerir bem o tempo – em casa parece que as horas voam ainda mais e há que fazer uma boa gestão. Mas esse é também um benefício – coloque-o a seu favor;
- Adorar a sua companhia – trabalhar fora do escritório pode levar a sentir alguma solidão, por isso é indispensável que haja contacto com os colegas ou outras pessoas.
Por isto tudo, admito que o teletrabalho não é para todos.
Com toda a legitimidade, há também quem precise de fazer o trajeto casa – trabalho – casa e sinta falta das outras rotinas que tinha – excetuando as horas no trânsito ou nos transportes públicos.
No entanto, atrevo-me a dizer que, de maneira geral, aquilo que os colaboradores mais sentiram falta foi do contacto, da interação e das relações ao vivo com os colegas e outros colaboradores da empresa.
Nas últimas semanas saíram vários artigos referentes ao teletrabalho, com resultados sobre sondagens feitas a colaboradores e empregadores.
De acordo com uma sondagem da Intercampus1, verifica-se que o chamado regime misto ou híbrido é o preferido pela maioria dos colaboradores, oscilando entre o teletrabalho 1 a 2 vezes por semana ou em semanas alternadas, privilegiando assim a flexibilidade e o equilíbrio com a vida pessoal.
Já um estudo do ManpowerGroup2 vem demonstrar a preferência dos empregadores portugueses – aqueles quem mais anseiam pelo regresso dos colaboradores aos escritórios – 74% prefere o modelo presencial.
“Capacidade de comunicação e colaboração, envolvimento e compromisso dos colaboradores e bem-estar psicológico” foram as provas de fogo das lideranças e aparentemente as justificações para os empregadores quererem, egoísticamente, manter-se no modelo antigo.
No entanto, das pessoas que experimentam o teletrabalho ou o trabalho remoto – aquelas que gostam, muito dificilmente se revêm a trabalhar novamente da forma tradicional. Quem tem a possibilidade de gerir o seu tempo e conseguir organizar o trabalho com a família – vai colocar esta flexibilidade como prioridade e critério de seleção na busca de um futuro emprego.
Há até quem pondere demitir-se, caso o teletabalho não seja uma possibilidade.
É forçoso concluir que a pandemia trouxe, pelo menos, uma coisa positiva – a constatação de que trabalhar à distância não só é possível, como é produtivo. Verificou-se também que esta nova forma de trabalho, mais do que um benefício, se tornou um requisito pedido pelos (futuros) colaboradores.
Não obstante, e como animais sociais que somos, acredito que o sistema híbrido será o mais equilibrado. Os escritórios físicos devem ser repensados, pois passam a ter uma função diferente – de encontro, de reunião, troca de ideias, de convívio.
É necessário que as organizações se adaptem e saibam responder às novas realidades, caso contrário correm o enorme risco de serem ultrapassadas por aquelas que colocam as pessoas, o seu reconhecimento, valorização e felicidade à frente da microgestão.