“Quem tem um porquê, enfrenta qualquer como”

O ano de 2020 ficará na história da humanidade como um marco, um verdadeiro divisor de águas. A pandemia mundial coloca o ser humano de todos os países em contato com uma realidade que se encarregou de desconstruir muito do que era conhecido, nos trazendo a lembrança da frase do escritor Luís Fernando Verissimo, “quando a gente acha que tem todas as respostas, vem a vida e muda todas as perguntas”.

O impacto nas sociedades tem sido enorme com abalos em todas as esferas: social, política, econômica, ambiental, da saúde pública enfim, em todos os segmentos. Vamos fazer um recorte para trazer esta reflexão para o ambiente organizacional e mais especificamente o papel do líder no gerenciamento desta crise.  Se antes da pandemia, já vivíamos numa situação bastante crítica em alguns aspectos, com seu advento, muitos problemas foram agravados sobremaneira.

A depressão e a ansiedade em 2019 já atingiam 20 milhões de brasileiros. Pesquisa do mesmo ano aponta que um em cada cinco trabalhadores do país sofre de burnout, doença relacionada ao stress permanente no trabalho. Ou seja, a pandemia surge e coloca uma intensidade muito maior em questões que já existiam antes dela e, além disso, traz novos elementos, muitos deles compondo um cenário assustadoramente desafiador, principalmente pelo inédito e pelo desconhecido. Quanto de nossas doenças graves podem ser desencadeadas por nossos pensamentos?

Volátil, incerto, complexo e ambíguo

No mundo VUCA em que vivemos- volátil, incerto, complexo e ambíguo, as empresas ocupam um papel fundamental e os líderes como seus representantes são justamente aqueles de quem se espera a condução do negócio. A pressão sofrida pelos líderes é enorme e cada vez maior. Deles é exigido o domínio do negócio e a gestão de pessoas, com competências que mudam, se aperfeiçoam e exigem deste profissional um eterno reciclar. Ele precisa aprender a aprender e mais do que isso: desconstruir modelos mentais, inovar e reconstruir com outras informações.   ?

O fato é que este cenário complexo já existia antes e o quadro causado pela doença literalmente pode impedir que a pessoa respire é como se, apesar de enormes esforços, faltasse o ar.  O cenário não se tornará mais fácil, muito pelo contrário e boa parte dele ainda nos é desconhecido. Não sabemos como será o mundo dito normal depois da pandemia e muito se ouve a respeito de uma nova normalidade.  Como fazer então para sobreviver e transitar com menos sofrimento

Não temos nenhuma receita

Mas há possibilidades de utilizarmos algumas referências.  A frase que dá título a este artigo, embora muitos atribuam ao psiquiatra austríaco Viktor Frankl, foi originariamente dita pelo filósofo Nietzsche e resgatada por Frankl, em seu mais famoso livro: Em busca de sentido.  Neste livro, Frankl, que foi prisioneiro de campos de concentração nazista, relata sua vida nos campos e sua análise dos porquês alguns conseguiam sobreviver mesmo com as crueldades e brutalidades impostas aos prisioneiros.

Este é um livro que nos faz repensar a vida. Pessoas colocadas em situações desumanas e conseguindo sobreviver.  Podemos aprender com estes relatos de experiências vividas por outras pessoas sem necessariamente vivermos fisicamente estas mesmas experiências. Viktor Frankl criou a logoterapia e nos ensinou sobre a capacidade do ser humano transcender. Esta situação de sofrimento extremo, manter a liberdade interior e não renunciar ao sentido da vida, apesar de tudo. Quem encontra um significado, mesmo no sofrimento, consegue suportar e sobreviver.

O líder precisa antes de qualquer coisa, mergulhar num profundo processo de autoconhecimento

Conhecer suas crenças e a origem delas, muitas das quais podem inclusive ser limitantes, conhecer suas fraquezas e fortalezas, conhecer-se em sua totalidade, o que significa o lado luz, mas também suas sombras, aquilo que ele tenta negar em si e projeta no outro.  Após esta etapa inicial, conhecer quais são seus valores e qual é o seu nível de consciência. Dependendo deste nível, sua tomada de decisão será de um jeito ou de outro. Na sequência é importante que ele reflita sobre seu propósito de vida de uma forma muito profunda.

Qual é o sentido de sua existência? Este propósito pode ser vivido nesta organização?  Há alinhamento de valores individuais e organizacionais?   Se este alinhamento houver, o processo de engajamento será muito melhor, mais verdadeiro, mais forte.  O líder que se conhece saberá compreender sua dinâmica com o outro, principalmente com seu liderado e por estar “bem resolvido”, não terá medo de expor vulnerabilidades. Esta exposição permite a criação do verdadeiro vínculo de confiança. Mostrar que ele não é um super herói, que ele não tem as respostas, mas que, ciente da relação entre todos e do processo de interdependência, ele poderá ser um facilitador do processo de aprendizagem coletiva.

Tempos desafiadores como o atual, além de exigirem competências como aprender a aprender, flexibilidade, resiliência, pedem também um líder que se conheça, conheça seus limites, possa inclusive fazer uso da intuição e da inspiração, seus valores, seu proposito e conexão profunda com este propósito: quem tem um porquê, enfrenta qualquer como!