A pessoa certa no lugar incerto!

A pandemia veio reforçar, tanto na vida profissional como na vida pessoal, a importância de sentir confiança em quem nos rodeia e, mesmo sem estarmos fisicamente presentes, temos de confiar que cada um está a fazer a sua parte para que o todo saia vitorioso e os resultados desejados sejam alcançados.

Durante anos li e ouvi a frase “a pessoa certa no lugar certo”, e apesar de encontrar muito de verdade na sua mensagem sublime, sempre achei que não era uma verdade absoluta. Tive a oportunidade de algures na minha vida académica escrever sobre esse facto e de deixar a minha apreensão e desconfiança sobre esta velha máxima da gestão de pessoas, contrapondo sempre com a pergunta retórica:

“Não fará mais sentido falar-se em: a pessoa certa no lugar incerto?”

Após mais de uma dúzia de anos, esta dicotomia continua presente na minha vida enquanto gestor de recursos humanos, mas acima de tudo enquanto líder e gestor de equipas. A conclusão a que vou chegando, ano após ano, experiência após experiência, é que a velocidade a que avança a nossa vida, principalmente a profissional, faz com que, a minha verdade sobre este tema, seja “a pessoa certa no lugar incerto”.
Nas próximas linhas tento apresentar as razões que me levam a chegar a esta conclusão.

Sempre que leio ou oiço algum gestor dizer que, quando recruta alguém para a sua equipa, as competências comportamentais são muito mais relevantes do que as técnicas, porque as competências técnicas são mais facilmente trabalhadas, então, a minha verdade torna-se ainda mais clara na minha mente. Eu traduzo esta visão de gestão em algo como:

“Desde que eu encontre a pessoa certa, com os valores adequados e a motivação adequada, o resto das ferramentas tenho ao meu dispor para ajudar esta pessoa a ser bem-sucedida, no que HOJE eu preciso que seja feito”.

Com a velocidade a que as coisas evoluem, sabemos que o que muitas vezes hoje é uma prioridade, amanhã passa a obsoleto e pouco relevante, e se procurarmos a pessoa certa para o lugar certo, num mundo tão incerto, podemos estar a cometer um erro, enquanto gestores, que pagaremos a médio/longo prazo.

Acredito que devemos procurar ter nas nossas equipas as pessoas com a atitude, a motivação e os valores certos e isso fará com que o lugar certo seja a minha empresa e a minha equipa, evitando olhar para o lugar certo apenas na perspetiva da função/tarefa a executar. Faz-me
pensar que devemos procurar contratar sempre tendo em vista a empresa e nunca apenas a função, o que habitualmente nos levará a procurar, não a melhor pessoa, mas a mais adequada.

Obviamente que a pessoa mais adequada pode ser igualmente a melhor, mas não necessariamente. Acima de tudo a pessoa mais adequada é a que sentimos que terá maior probabilidade de ser feliz na minha equipa e na minha empresa, de se integrar de forma mais rápida e eficaz, de absorver e envolver-se na cultura da empresa e a partir daí desempenhar tecnicamente bem a função para a qual estou a contratar, mesmo que necessite de mais ferramentas para se desenvolver e poder obter os resultados esperados.

Quando recrutamos com base nestes pressupostos, estamos a recrutar com vista ao futuro, que, como nos tem vindo a demostrar, é cada vez mais um lugar incerto.

Se pensarmos que as pessoas habitualmente não querem estar a fazer a mesma coisa de forma permanente e que as empresas estão sempre à procura de evoluir e desenvolver-se, o lugar certo, tende a deixar de existir.

Se simultaneamente virmos a forma como, por exemplo, a evolução tecnológica nos tem permitido/incentivado a transformar as metodologias, as funções e os processos de trabalho, percebemos que mais uma vez o lugar certo é uma miragem. Inclusive, assistimos nos últimos anos, em especial desde o início da pandemia, a outro fenómeno que é o facto de até o lugar (local) onde trabalhamos ter passado a ser incerto.

Sendo claro e objetivo, parece-me impossível ter 100% das nossas pessoas neste registo e teremos de continuar a contratar várias pessoas certas para o lugar certo até encontrarmos algumas pessoas certas para o lugar incerto.

Este resultado faz parte do jogo, e é perfeitamente aceitável e saudável que assim seja. Mas como em tudo, devemos procurar a perfeição, e para mim, ao nível da aquisição de talento, a pessoa certa no lugar incerto, funciona como uma linha orientadora e uma meta contínua, que nos fará, enquanto líderes, construir uma equipa para a vida.

Em suma, como líder, posso não saber ainda para onde vou, mas sei habitualmente com quem quero ir, ficando cada vez mais claro para mim, que devo sempre procurar encontrar a pessoa certa, num lugar incerto, para ocupar um lugar incerto, onde vai estar a fazer algo incerto e por um período de tempo incerto.