Impacto da pandemia nas tendências dos processos de recrutamento & seleção no setor das TI

Os processos de recrutamento & seleção no setor das tecnologias de informação desde há muito que se diferenciam, pela sua singularidade, dos existentes nos restante setores: são processos caracterizados, na sua generalidade, por pesquisas mais intensivas, participantes mais exigentes, valores de remuneração consideravelmente mais elevados, e uma forte concorrência nos projetos. Porém, com a chegada da pandemia COVID-19 a Portugal, em março passado, todas as atividades foram impactadas e o paradigma dos processos de recrutamento & seleção não ficou indiferente a tais mudanças.

Urge assim apresentar uma fotografia dos processos de recrutamento & seleção durante o período pandémico, bem como um levantamento das alterações que se têm vindo a verificar e das suas consequências, de futuro, para o mercado.

Não é novidade que o setor de IT, em resultado de uma elevada procura por perfis especializados e da pouca capacidade de resposta do mercado nacional, é consideravelmente mais exigente nos processos de atração de talento. Como consequência, o setor recorre frequentemente ao sourcing de candidatos como estratégia de recrutamento, uma estratégia que passa pela identificação de candidatos passivos para uma posição específica e que é realizada maioritariamente com recurso a plataformas como o Linkedin, o GitHub, ou outras, com a finalidade de originar um primeiro contacto.

Segue-se depois um diálogo a fim de responder a algumas questões sobre projetos ou a requisitos de mudança, muitas vezes relacionados com questões salariais ou com a tipologia de projeto e alocação. A COVID-19 veio, contudo, agravar
este paradigma de atração de talento, já por si difícil, conduzindo a novas exigências por parte daqueles que se disponibilizam a mudar. Estas exigências têm tomado forma principalmente através de um aumento da procura por projetos full-time remote ou por um medo agravado de mudança.

Com a mudança das empresas para uma metodologia de trabalho à distância, temos verificado que um dos principais requisitos e fundamentos para novos projetos é a procura por uma garantia de que tal metodologia se manterá numa situação pós-pandemia. Esta posição é habitualmente acompanhada por argumentos de autonomia no horário de trabalho; poupança económica nas refeições e na deslocação; movimentos de migração interna para as localidades
de origem; ou melhoria significativa da qualidade de vida, fruto da poupança de tempo e diminuição de stress nas deslocações trabalho – casa (que assim deixam de se realizar), permitindo aproveitar esse período para atividades pós-laborais ou para estar mais tempo com a família.

Já no sentido oposto, temos sentido um aumento do medo de mudança, i.e. o medo de trocar o certo pelo desconhecido. Este sentimento tem originado uma desconfiança generalizada perante a possibilidade de assumir novas funções e novos projetos, mas também perante as modalidades de consultoria, outsourcing ou outras formas de alocação externas. Cremos que tal se deverá ao receio, sentido pelos candidatos, de poderem ser dispensados no fim do projeto, à semelhança do que se verificou, no período do confinamento obrigatório, em algumas empresas do setor.

No que respeita ao processo de seleção, este tornou-se, por força das circunstâncias – e à semelhança do que aconteceu também em outros setores -, verdadeiramente digital. As entrevistas de emprego, que eram, frequentemente, fatores impeditivos em alguns processos pela falta de disponibilidade do candidato em deslocar-se e/ou pela exigência da presença física por parte de algumas empresas, passaram a ser realizadas, invariavelmente, de forma remota.

Tal medida tem vindo a beneficiar candidatos – por deixar de implicar deslocações -, recrutadores – permitindo expor às chefias que é possível construir um pool de talento à distância -, e ambas as partes, quando considerada a agilidade do processo e a disponibilidade horária que passou a existir. De facto, os candidatos interessados, por estarem fora do seu
ambiente laboral, passaram a demonstrar uma maior flexibilidade no agendamento de entrevistas.

Ora, se podemos, por estes motivos, tirar partido da distância física aquando do processo de entrevistas, já no que respeita ao processo de proposta e consequente integração tal distância poderá torná-lo mais complexo, pois o candidato – especialmente no caso dos projetos de consultoria -, poderá ter mais dificuldade em definir uma relação de compromisso à distância.

Assim, os colaboradores que passam agora por processos de onboarding – que ocorrem, na sua maioria, com sessões virtuais -, são colocados num novo projeto sem nunca terem estado fisicamente com os seus pares. Tais processos, se não forem devidamente acompanhados, poderão, a médio/longo prazo, agravar as dificuldades de retenção já existentes, uma vez que colaboradores desmotivados e sem uma comunicação eficaz com os seus gestores serão colaboradores mais vulneráveis a propostas de mudança.

Deste modo, entendemos que as empresas de tecnologias de informação continuarão, num cenário pós-pandemia, a enfrentar cada vez mais desafios nos seus processos de recrutamento & seleção, e, em consequência, na integração dos colaboradores. Isto dito, parece-nos, porém, que a tendência do digital deve ser mantida como forma de alcançar o sucesso. Os processos de recrutamento & seleção para posições de tecnologia deverão continuar a pautar-se pelo seu funcionamento à distância – assim tentando garantir a resposta às posições -, e os projetos deverão tornar-se cada vez mais atrativos na promoção da qualidade de vida dos seus futuros colaboradores, garantindo, por exemplo, a possibilidade de trabalho à distância de forma total ou parcial para aqueles que assim o desejam.

O setor ver-se-á forçado a definir novas estratégias de comunicação e acompanhamento para assegurar a manutenção da cultura organizacional e dos níveis de compromisso dos que dela fazem parte. O papel do Gestor de Recursos Humanos será fundamental para a superação de todos os desafios do recrutamento & seleção, integração e gestão de pessoas, bem como para a conservação da equipa e de um ambiente de trabalho saudável e dinâmico.