Lideranças Saudáveis

Quando tudo na vida das nossas Pessoas falha, a nossa liderança saudável não pode falhar.

Cedo tomei consciência de que não se é líder por decreto ou mera nomeação. Para os cargos designados formalmente atribuem-se outras designações que todos conhecemos (umas mais modernas do que outras): chefe, diretor, responsável e respetivos estrangeirismos: chief, director, head.

Todos estes cargos topo requerem skills que vão muito além da formação base, formação contínua, mba´s, congressos, livros, artigos. E que não se ensinam, sem ser na verdade sentidas e experienciadas. Aliás, atrevo-me a dizer que todos, enquanto gestores, seremos bastante conhecedores dos conceitos e boas práticas de uma boa liderança. Os nossos extensos currículos demonstram isso mesmo.

Várias vezes me questionam qual o melhor curso para investir se quisermos aprender mais sobre como gerir bem as nossas Pessoas. Ironicamente por vezes tenho a tentação em responder “quase todas as Pessoas em lugares como o meu fizeram a mais variadíssima formação executiva nestas áreas e parece que na hora de agir o vulgo “bom-senso” não aparece nas suas ações, fazendo perder na prática as longas horas (e euros) de investimento em formação”.

Assim sendo, estaremos no mesmo ponto de partida para liderar? E para nos auto-liderar? E para procurar ser um líder saudável?

No limite, a derradeira questão poderia ser, estarei eu disponível para seguir o líder que eu sou? Seria eu próprio influenciado por “ele”? Antes de mais, influenciar alguém é motivá-lo a fazer algo, por vezes, nunca feito.

E motivar, por sua vez, é mais do que dar ânimo: é dar um propósito, propósito para trabalhar a favor de todos os níveis da organização, aprendendo com as pessoas, independente da hierarquia.

Quem me conhece sabe, nos lugares por onde passo (e efetivamente já foram alguns), encontro-me sempre com Pessoas extraordinárias e que me fazem ganhar o dia com um simples café logo pela manhã, e as curtas, mas necessárias conversas de 5 minutos sobre a vida quotidiana, nossa e dos que nos rodeia, necessárias porque nos torna genuínos e nos mantêm saudáveis.

Há uns dias uma Pessoa, líder, que muito respeito me dizia que escolher ser médica ou médico por profissão poderá conter em si um lado altruísta, mas também, e se calhar em maior parte, um lado egoísta. Assim também o será quando decidimos manter-nos em lideranças que nos sugam a energia, mas nos fazem incansavelmente felizes. Poder mudar a vida para melhor de uma qualquer outra Pessoa, próxima ou perfeita desconhecida, faz-nos inevitavelmente bem e fazemo-lo, estou certa, por esse mesmo motivo também: fazer bem às outras Pessoas, faz-nos bem a nós próprios. Chegar a casa no final de mais um dia e sentirmos no seu ímpeto a expressão “missão cumprida” é efetivamente um vício e que, assim queiramos, não terá fim.

Mas como encontrar equilíbrio quando algo falha na vida das nossas Pessoas e sentimos que a nossa liderança não lhes poderá falhar também?

Todos nós já tivemos nas nossas equipas Pessoas que desistiram ou encontraram uma alternativa melhor. Penso nisso de forma séria cada vez que sou surpreendida (às vezes nem assim tão surpreendida) por esses “abandonos”? E penso para mim, eu que já troquei várias vezes de projeto e de equipa, estes percursos nem sempre são da responsabilidade de quem lidera. Mas alguns serão. Não tenho qualquer dúvida. E teremos Pessoas que desistem (pelos mais variadíssimos motivos), mas que necessariamente não abandonam as nossas equipas, e é precisamente estas que devemos tentar recuperar.

Recordo o dia em que recebo uma chamada de um dos meus coordenadores, a A. tinha acabado de ingerir medicação em excesso durante a hora de serviço. Estava paralisada, sem qualquer reação, e irredutível em não contar o que havia tomado. Nesse momento voei a maior e mais rápida corrida dentro daquele meu hospital. Sabia, porque estava atenta e os colegas também, que a sua vida em casa estava numa fase mais que difícil para si e para os seus. Sabia porque sempre me preocupei bastante com a felicidade e o equilíbrio das minhas Pessoas. E porque sabia exatamente o que se estava a passar, estaria em melhores condições de ajudar. Era hora de agir e transportar a nossa função muito para além das portas da nossa Organização. A. recuperou, agiu com coragem e seguiu em frente. Sentiu necessidade de mudar de rotina, saiu da nossa equipa e uns anos mais tarde regressou. Recebia com a mesma energia e enorme felicidade. A sua vida tinha ganho novo sentido outra vez.  Foram vários, muitos, os momentos em que fui “chamada” a agir – não só como líder, mas como comum Pessoa com especial sentido de responsabilidade sobre os que me rodeiam. E várias as vezes que os outros que me rodeiam no trabalho, tiveram também eles essa função em mim. É um círculo virtuoso, este dar e receber de equilíbrio e energia.

Efetivamente, o grande desafio nos dias de hoje é estar disponível para os outros, mas também para nós, procurando um equilíbrio entre o que nos preocupa, o que nos causa ansiedade, o que nos cansa e entre o que nos orgulha, nos motiva e nos enche o coração.

O trabalho não pode ser uma exceção. E devemos estar atentos aos primeiros sinais de algum desequilíbrio e tentar compensar ou, se esta situação tender a piorar, no limite, procurar ajuda. Nos dias de hoje a saúde mental deve fazer parte da nossa agenda e as instituições devem pensar na sua estratégia em matéria de Pessoas incluindo a tão importante saúde mental.

A maioria de nós não dispõe de suporte ou ferramentas orientadas à saúde mental, o que influencia as Pessoas, causa o seu afastamento e pode levar à ausência de motivação trazendo uma sensação de inércia profissional sem esquecer que o clima organizacional ele próprio impacta na saúde mental das suas Pessoas. E algumas dessas Pessoas são, inevitavelmente, os líderes das nossas organizações. Daí a sua determinante importância em se manterem saudáveis.

Um líder deve ter a capacidade de motivar as suas pessoas de forma positiva e de conseguir apresentar o clima organizacional da sua instituição com objetivo de proporcionar experiências positivas com base em aspetos motivacionais, evitando assim o absenteísmo, incentivando o desenvolvimento pessoal para que com resiliência e motivação possa exercer a sua função sem que desenvolva síndromes e/ou traumas psicológicos. Estarão as nossas organizações a investir nestas áreas de suporte emocional e de saúde mental? Na promoção da qualidade de vida das suas Pessoas? A segurança psicológica vinda da parte das nossas lideranças é o ingrediente chave para a felicidade no trabalho. E essa segurança psicológica só se mantém no tempo se os líderes também eles procurarem manter-se saudáveis. Nem que para isso, precisem de recorrer esporadicamente, eles próprios a ajuda.

Como escrevi no início, quando tudo na vida das nossas Pessoas falha, a nossa liderança saudável não pode falhar.