Porquê falar em Liderança Ética?

Os escândalos éticos dos últimos anos em empresas como a Enron, Volkswagen, Lehman Brothers ou Uber têm servido de palco para o estudo de um novo estilo de Liderança: a Liderança Ética. O trabalho conduzido por Treviño e colaboradores (2000, 2003) dá-nos conta de que os líderes éticos são vistos pelos colaboradores como honestos e de confiança, pois adotam a ética como parte integrante da agenda organizacional e da sua agenda enquanto líderes, procurando comunicar frequentemente os comportamentos éticos aceitáveis e recompensando quem segue essa conduta. Nesta ótica, são igualmente considerados justos e com elevados princípios morais, uma vez que durante o processo de tomada de decisão se preocupam com as pessoas, e transportam a ética quer na sua vida pessoal quer na sua vida profissional.

Diversos estudos têm defendido que a eficácia da liderança se deve, na sua essência, ao comportamento ético dos líderes, tornando-se uma característica-chave em várias teorias de liderança, tais como a liderança transformacional (Bass, 1985; Burns, 1978), liderança autêntica (Avolio & Gardner, 2005), servant leadership (Greenleaf, 1977) ou liderança espiritual (Fry, 2003). No entanto, enquanto estas teorias sublinham a importância da ética para a liderança, apenas a liderança ética se propõe a explicar a influência do comportamento ético dos líderes sobre o comportamento ético dos seguidores (Brown & Treviño 2006). Para suportar teoricamente esta relação, Brown e Treviño (2006) utilizaram dois referenciais teóricos: a Teoria da Aprendizagem Social (Bandura, 1977) sugere que os indivíduos aprendem as normas de conduta apropriada através da própria experiência ou através da observação e posterior reprodução dos comportamentos de modelos credíveis. Por sua vez, a Teoria da Troca Social (Blau, 1964) propõe que quando os indivíduos consideram que o líder se preocupa genuinamente com o seu bem-estar sentem que devem retribuir este apoio do líder (Gouldner, 1960).

Para complementar esta narrativa, Brown e colaboradores (2005) descobriram que a liderança ética tem uma relação positiva com a confiança afetiva no líder, e que as perceções dos colaboradores sobre liderança ética predizem a satisfação dos mesmos com o líder, bem como a perceção de eficácia do líder, a predisposição de fazer um esforço extra no trabalho (i.e., dedicação no trabalho) e a propensão para reportar problemas aos superiores hierárquicos. Adicionalmente, a investigação sugere que os colaboradores que prestam atenção a comportamentos éticos por parte dos líderes tendem a percecionar que se encontram numa relação de troca social com os mesmos, devido ao seu tratamento justo e atencioso e ao sentimento de confiança mútua que é transmitido, e, consequentemente, sentem-se mais inclinados para se comprometerem com comportamentos de cidadania organizacional (i.e., comportamentos pró-sociais) (Dirks & Ferrin, 2002; Konovsky & Pugh, 1994; Podsakoff, MacKenzie, Paine, & Bachrach, 2000). Não obstante, dada esta relação de troca social (Blau, 1964) percecionada pelos colaboradores, é, ainda, possível que estes sintam o desejo de retribuir o cuidado, o tratamento justo e a confiança que recebem, baixando assim a probabilidade de apresentarem elevados níveis de comportamentos desviantes na organização (i.e., comportamentos contraproducentes). Estes níveis são tanto menores quanto maior for a qualidade da relação de troca entre líderes e liderados.

Porém, embora os resultados globais do estudo Ethics at Work: 2021 international survey of employees nos deem conta de que os padrões éticos das organizações apresentaram melhorias consideráveis durante a pandemia Covid-19 e que os programas de ética estão a ter cada vez mais impacto, este estudo demonstra também que os colaboradores continuam a sentir medo de sofrerem represálias por reportarem problemas aos superiores hierárquicos. Dos colaboradores inquiridos, 43% reportou ter sofrido retaliação após reportarem problemas de má conduta ética aos superiores hierárquicos. Por este motivo, a par dos programas éticos, é importante que as organizações demonstrem, durante o processo de recrutamento e seleção para cargos de liderança, que valorizam pessoas com características de liderança ética, por forma a atraírem os profissionais que também valorizam essas características, evitando, assim, elevados custos e baixa eficácia no processo de recrutamento e seleção. Por outro lado, as organizações devem, igualmente, procurar incorporar programas de desenvolvimento de líderes éticos nas suas ações formativas, para que estes se revistam da capacidade de lidar com a complexidade dos problemas do foro ético, despertando também a sua atenção ao tipo de problemas que podem surgir num determinado trabalho ou indústria.

Outra ação passa por as organizações darem formação de competências de relacionamento e comunicação interpessoal necessárias para tratar os colaboradores de forma justa. As organizações que valorizam uma cultura ética adotam mecanismos que apoiam a tomada de decisão ética em situações complexas, pelo que uma possível ação passa por promover e recompensar, através do sistema de gestão do desempenho, os líderes que alcancem as expetativas de comportamentos éticos, por forma a retê-los na organização. Por último, investigações anteriores demonstram que os líderes éticos surgem como modelos de atuação junto dos seus liderados (com base na Teoria da Aprendizagem Social), pelo que os seus comportamentos (verbais e não verbais) influenciam determinantemente a demonstração de comportamentos éticos por parte dos seus colaboradores. Assim sendo, é importante que as organizações invistam no desenvolvimento de um clima organizacional ético.

Para que tal seja possível, é importante a criação de um código de conduta que sirva de bússola moral a toda a organização, através do qual os colaboradores que se comportam de acordo com os padrões éticos e morais desejados devem ver a sua conduta recompensada e reconhecida, pelo contrário, a conduta antiética deve ser punida de forma exemplar (independentemente do cargo ou posição ocupada pela pessoa em causa).