Take 7 – Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades!
O grupo de Diretores estava reunido com o CEO, na sala mais solene, que era usada quando havia uma comunicação mais impactante, sabendo disto, estavam todos muito quietos e circunspectos, como meninos da escola no seu primeiro dia aulas. O silêncio era tão notório, que quase se podia ouvir a própria respiração e o leve ranger do soalho.
O Dr. António Luvinha D´Rei, que ocupava o lugar cimeiro da mesa, levantou-se e começou por dizer:
– Hoje tenho informações relevantes para partilhar, vão acontecer mudanças na organização e com certeza conto com a vossa lealdade, motivação e espírito de equipa para as implementar, de facto o período de férias permitiu-me uma reflexão profunda sobre a empresa, o caminho e os resultados que ainda não aconteceram como eu esperaria, tive oportunidade de manter uma longa conversa com os acionistas e estamos alinhados. E continuou…
– Um novo acionista irá adquirir 60% do capital, e, portanto, avizinham-se tempos muito desafiantes e exigentes, mas também muito promissores, capital fresco, possibilidade de crescer e a saída do “vermelho” que tanto esperávamos!
O grupo de Diretores exigiam uma expressão de clara surpresa, pareciam estátuas humanas, pregados as cadeiras sem qualquer movimento visível…
O CEO retomou o seu discurso fingindo não sentir o pânico na sala…
– Ainda estamos numa fase de grande descrição e, portanto, a informação é estritamente confidencial, ninguém pode comunicar com ninguém nem na empresa nem fora dela, não queremos os meios de comunicação a entrar-nos pela porta dentro sem os chamarmos. Confio na minha equipa, mas aviso que se alguém não seguir as regras, certamente será motivo de um convite de saída da empresa, desculpem a franqueza, mas há que ser claro e gerir as expectativas! Alguma questão que queiram colocar?
– Os nossos lugares podem estar em causa? – O Contas do Rosário lançou o primeiro dardo e estava aberto o jogo.
– Neste momento não há que temer, as competências e o desempenho são sempre o mais importante, quem é bom no que faz, só tem de passar a ser excelente e assim não há concorrência. É a lei de mercado…ou de Darwin… ou talvez ambas… eu seria a primeiro a ter este tipo de preocupações, mas não tenho! E sabem porquê? Porque me ofereceram um belíssimo cargo de administrador não executivo, que estou convicto é mais do que merecido, um novo CEO chegará em breve para liderar a equipa, só boas notícias!
O pânico subiu a parada e agora podia ver-se um grupo de boca semiaberta e olhos esbugalhados muito parecido com o horror um peixe nos seus primeiros minutos fora de água… custava a respirar era melhor abrir as janelas (o Patente Elevada levantou-se e abriu-as mesmo de par em par). – Há que renovar o ar nesta sala, oxigenar os neurónios, na tropa diz-se que o que não mata torna-nos mais fortes!
– Desculpem perdi-me nas últimas linhas da acta, pode repetir Dr. António Luvinha? – O Santiago Brazão, bravo e corajoso assessor de Direção, leia-se assistente do CEO e seu fiel Sancho Pança, tinha um nó na garganta e aliviava efusivamente o nó da gravata, era uma cena digna de um filme de Almodovar, hiperbolizado nas emoções e ligeiramente exagerado.
– Nunca me peça essas coisas, sabe que detesto repetir-me! Peça aos seus colegas que o ajudem no final da reunião, tenho a certeza que entre todos possuem toda a informação, que diabo homem tem de ser mais ágil, ouça e escreva, tão simples como isso! – O CEO mostrava impaciência na forma como esfregava as mãos e feriu a frágil suscetibilidade do seu assessor, que baixou a cabeça e quase se tornou invisível depois desta chamada de atenção.
– Quando for o momento teremos de pensar na comunicação interna, as pessoas precisam de se manter tranquilas e com o nível certo de informação, caso contrário podemos ter algumas a tentar sair da empresa, dado que a incerteza pode levá-los a olhar para o mercado de trabalho, temos de pensar num plano de retenção de talentos – A Dra. Benedita parecia estar a pensar alto, com alguma preocupação no olhar.
– Plano de retenção? Ora essa! Vamos ter mais dinheiro, mais meios e maior market share e diz-me que as pessoas querem ir embora? Prepare-se é para um plano de reorganização, fazer mais com menos isso sim, os níveis de produtividade estão pelas ruas da amargura, somos muito permissivos! Com franqueza Dra. Benedita, parece que se trata duma tragédia, quando na verdade vamos agora viver uma conjuntura mais favorável! Não seja pessimista e foque-se nas coisas realmente importantes.
A reunião terminou e ainda consegui ouvir o Santiago Brazão, à saída da porta a interpelar os colegas – Posso ter uns minutos da vossa atenção para me ajudarem a escrever as últimas linhas da acta? – Tão a propósito da sugestão do CEO – focar nas coisas que são realmente importantes, ora nem mais!